27 janeiro 2008

DISCIPLINAS SEM MANUAIS OBRIGATÓRIOS

in: Público de Sábado, 12 de Janeiro de 2008

A compra de manuais escolares de algumas disciplinas deixa de ser obrigatória a partir do ano lectivo 2010/2011, ao abrigo de uma portaria ontem publicada. A portaria define que não serão adoptados manuais escolares nas seguintes áreas e disciplinas: Expressões Artísticas e Físico-Motoras do 1º Ciclo do ensino básico; áreas curriculares não-disciplinares dos 1º, 2º e 3º ciclos do ensino básico e ensino secundário; Educação Física, Musical, Visual e Tecnológica do 2º ciclo do ensino básico; Educação Física e Artística do 3º ciclo do ensino básico e Educação Física do ensino secundário.”

Olhando para esta notícia e fazendo uma retrospectiva do sistema educativo desde 1976, altura em que as expressões artísticas, no sentido literal da expressão, iniciaram a sua integração no sistema educativo, verificamos que até 1992/94 fomos aumentando os horários da Expressão Dramática, Expressão Musical e Expressão Visual no 1º ciclo do ensino básico e na formação de professores do 1º ciclo do ensino básico e formação de educadores de infância. Também verificamos que se aumentaram as horas da disciplina Expressão Dramática e Teatro dos 9º 10º e 11º anos do secundário.

Esta realidade levou a que aparecesse nos dois sistemas do ensino superior, Politécnicos e Universidades, cursos de Teatro com variantes de Expressão Dramática e de Teatro na Educação.

Ainda esta realidade permitiu que se apostasse em pós-graduações (mestrados e doutoramentos) de professores em Arte, nomeadamente professores de Teatro e de Expressão Dramática do ensino superior, para valorizarem, na componente formativa dos professores de Teatro tout court e dos professores do 1º ciclo do ensino básico e dos educadores de infância que leccionam expressão dramática integrada numa área de expressões artísticas, as dimensões pedagógica, científica e didáctica.

Pois é. Foi só até essa data, porque a partir daí tem sido um descalabro. Na Formação de Professores e de Educadores de Infância as horas em Expressão Dramática e/ou Teatro, assim como das outras áreas artísticas, têm vindo a decrescer considerávelmente; no secundário perderam-se também muitas horas na disciplina de Expressão Dramática e Teatro.

Tem vindo a desvalorizar-se, em termos de formação artística, a oportunidade que os jovens tinham à sua disposição no sentido de desenvolverem práticas artísticas que constituíam a base de uma formação harmoniosa, humanista e estética e que, a maioria das vezes, enunciavam já os seus percursos profissionais para estas áreas.

Voltando à notícia acima referida. Ao ignorar-se o papel importante dos manuais, cuja função didáctica, pedagógica e científica permite estabelecer um ensino de qualidade em matéria de formação artística, desvaloriza-se a importância da Arte na Educação e projecta-se na opinião pública a ideia de que a Arte é um acessório, sem critérios de qualidade e objectividade, remetendo-a afinal para um lugar absolutamente secundário na Educação.

20 janeiro 2008

QUE CULTURA É ESTA AMIGO?

Mas soube-me a pouco, mas soube-me a pouco!
Parafraseando Sérgio Godinho, para dizer que a cultura que vamos tendo em Portalegre sabe-me efectivamente a pouco. Não tanto porque seja pouca ou inexistente, mas porque é atípica, porque não é estruturante e não faz parte de uma verdadeira e eficaz política de desenvolvimento local. Segundo Lebret* "A finalidade do desenvolvimento não é que os homens tenham mais, senão que sejam mais".

Do meu ponto de vista, não existe uma política cultural para o concelho de Portalegre!

Onde estão os espaços socioculturais comunitários? Literalmente não existem, assim como não existe esforço para preencher esta lacuna.

Onde estão as práticas culturais e artísticas da comunidade? Estão praticamente reduzidas aos grupos que existem de há 20 anos a esta parte.

Onde está o movimento associativo cultural e artístico? Simplesmente ignorado. Ausência absoluta de criação de condições que apele ao surgimento do novos grupos, novos projectos e novas linguagens estéticas, artísticas e culturais.

Onde está o apoio aos artistas e escritores locais. Ignora-se simplesmente a sua existência.

Onde pára um Órgão de consultoria que deveria ser importante na estrutura organizativa de um município, que é exactamente a Comissão Municipal de Cultura. A sua existência poria em causa esta espécie de política cultural local ou, simplesmente, não permitiria a gestão da cultura desta forma.

Onde está uma Rede Cultural intra-região e inter-regiões que permita o intercâmbio de projectos e produtos culturais e artísticos de qualidade e que rentabilize a preços mais económicos a função do Centro de Artes do Espectáculo (CAE). Comprometendo parcerias e mecenato nessa Rede.

Onde estão as dinâmicas culturais, artísticas e pedagógicas traduzidas pela existência de um departamento de animação, pedagogia e arte existente no CAE, capaz de incentivar o aparecimento de novos fazedores de cultura inter-geracional.

Os públicos de cultura não se criam só com a ideia de uma programação “à la carte”. Fazem-se com a vivência da fruição artística e cultural, é verdade, mas também e fundamentalmente se fazem com as vivências da própria experimentação e criação culturais.

Não quero interferir na gestão e programação do CAE, apesar de ser atípica, não estruturante e inacessível. Serve uma minoria da população da cidade e não incentiva, nem cativa a maioria da população do concelho.

Continua a fomentar-se, pelas freguesias do concelho, unicamente, as festas tradicionais de expressão mais popular, assente eternamente no espaço bem português dos “comes e bebes” em detrimento de outras vivências e contactos com objectos culturais diversificados na estética e na linguagem.

Esta reflexão permitiu-me aprofundar a ideia de que os hábitos e as práticas culturais têm uma correlação com a utilização desses potenciais espaços de fruição e criação culturais, contribuindo, assim, para a criação de públicos culturais fruidores e produtores de cultura.

Esta reflexão também me elucida definitivamente sobre a inexistência de compromissos respeitantes à cultura e à arte, entre os responsáveis da cultura da autarquia de Portalegre e as suas populações, apesar de irem ser gastos 500 mil euros no CAE. Esta operação de charme permite iludir os incautos, os bem-intencionados, os indiferentes, os revoltados, os acomodados e os pobres.

Não desvalorizo o financiamento que se irá fazer no CAE e na Quina das Beatas. Apenas recomendo, por um lado, uma maior justiça distributiva para todo o concelho e, por outro lado, uma maior disposição política para estabelecer itinerários de cultura por todo o concelho.

Estes dois princípios acentuam a emergência da construção ou da recuperação de espaços de socialização comunitária capazes de serem, simultaneamente, receptores de objectos de uma maior diversidade de estéticas e de linguagens artísticas e culturais inovadoras e espaços comunitários de experimentação artística e cultural, também inovadora, mas com um sentido claro de expressão local.
* Citado por Ander-Egg (1980): "Metodologia y práctica del Desarrollo de la Comunidad." Buenos Aires, Humánitas.

14 janeiro 2008

EMPREGO E PROFISSÃO DE ANIMADOR(a)

O emprego, independentemente das profissões, está hoje no limite. Vai servindo as gerações mais velhas e menos qualificadas. Enquanto estas dão, progressivamente, entrada na reforma, as outras gerações, as mais novas, vão tendo uma resposta do emprego pouco significativa. O paradoxo está no facto de serem gerações cada vez mais qualificadas.

O emprego único e para toda a vida, como lugar de cultura de sobrevivência e de afirmação profissional, terminou. O seu lugar está a ser preenchido pela diversidade ocupacional, fruto das formações cada vez mais específicas e, paradoxalmente, cada vais mais acumuladas numa só pessoa.

A Animação, no seu sentido polissémico e na diversidade das suas modalidades, tal como outras áreas do conhecimento, das técnicas e das tecnologias, está também a sofrer o desgaste da ausência de oportunidades da sua afirmação. O animador(a) tal como o(a) vemos hoje é também um(a) profissional em mudança. Paradoxalmente uma mudança que parte de indefinições institucionais e que o(a) tornam um(a) profissional fragilizado(a). A diferença deste(a) profissional em relação a muitos outros, de outras áreas, é a de que ainda não teve espaço nem tempo para afirmar um perfil, uma função e também os seus estatutos profissionais.

Apesar de tudo, desde que existe a formação profissional e académica de animador(a), acerca de 15 anos, o espaço, as funções, as tarefas e as responsabilidades em que se envolveu formam elementos constitutivos de mudança social. Ressalta daqui, portanto, a importância desta profissão e a necessidade urgente de afirmá-la. Cabe, como já o disse noutra altura neste blog, às associações representativas de classe, às organizações empregadoras, às instituições de formação e aos animadores individualmente, a responsabilidade dessa afirmação. Esta razão só por si justifica, também já aqui o afirmei, a imediata realização de uma Conferência Internacional sobre a profissão de Animador(a). Não faz sentido, neste momento, continuar a discutir-se questões teóricas da animação. É uma dimensão demasiado insistida, já afirmada, fundamentada, com autores prestigiados, com obras de referência, etc. Mas é uma discussão meramente, e só, académica, no sentido literal. Eleva o ego dos investigadores, professores e instituições, mas vai descurando a motivação e a esperança dos profissionais de animação. A minha insistência na realização, a curto prazo, dessa conferência internacional sobre a profissão de animador(a) resulta da responsabilidade que exerço sobre mim, na minha qualidade de professor e de investigador, mas também na minha história pessoal como animador cultural, que o sou, desde os meus 16 anos.

Esta pequena reflexão resulta de uma preocupação permanente que transporto no meu espírito. Se é verdade que vou dizendo aos meus alunos(as) que devem arriscar em projectos com equipas pluridisciplinares, e será esse o seu futuro, não é menos verdade que continuo a insistir junto de potenciais empregadores para a importância deste profissional no seio das suas organizações. A forma de dar relevo a esta função e práticas poderá ser facilitada, hoje, através de projectos a realizar ou já realizados, divulgados via Internet em blogues ou sites específicos. São espaços de partilha importantes, não só do ponto de vista do estudante ou profissional da animação, como também das próprias organizações empregadoras e instituições de formação. Esta é uma experiência que tenho vindo a realizar conjuntamente com os(as) meus alunos(as) finalistas e que me leva a reconhecer ser um instrumento inadiável na formação e na profissão emergente.

Voltando à Conferência Internacional sobre a profissão de Animador(a) e aos documentos que daí poderão surgir e que pressionarão não só as organizações mas também as decisões políticas, nomeadamente alterando o que já foi legislado sobre a profissão de animador, parece-me dever ser uma iniciativa das associações de classe, especialmente da APDASC, ANASC e outras que porventura existam e tenham representatividade profissional. Por outro lado cabe também a cada um(a) dos(as) animadores(as) criar dinâmicas que constituam também elas mudanças importantes na profissão. Para isso devem participar no movimento associativo/profissional, integrando ou criando novas associações profissionais. Por exemplo, a APDASC vai eleger hoje, dia 14 de Janeiro, novos corpos gerentes, sendo interessante a participação plena dos seus associados.
Ao mesmo tempo que projecto o desejo de que possam aparecer outras associações, reformulo também votos de que a ANASC, que tem história no movimento da Animação Sociocultural em Portugal, possa e deva renascer com a ATITUDE que fizeram dela uma referência indispensável na reflexão da animação sociocultural em Portugal.

13 janeiro 2008

O PÁSSARO DE FOGO

Era uma piriquita muito amarela de penas. De fogo, tinha a força que só os grandes de cada espécie merece ter. Era uma piriquita já muito, mas muito velha, que não mostrava ser apenas alguns a merecer a imortalidade.
Desde muito nova naquela casa, com muita gente em redor, ela saltava, cantava, gorjeava e seduzia, deixando os seus donos embevecidos e ternamente orgulhosos daquela versátil cantoria.
Um dia pensaram os donos: “e se déssemos um companheiro à Tona?” - era assim que a chamavam por andar sempre nas alturas ou, mais concretamente, voava e saltava sempre pelo espaço e plano superior da gaiola. Jamais se passeava pelo chão da mesma, pelo contrário, só saltitava de tronco em tronco e, de preferência, sobre aqueles colocados nos pontos mais altos da sua habitação. Queria, porventura, ter uma visão do mundo mais abrangente. Desse companheiro há, para aqueles donos, poucas memórias, já que pouco tempo depois apareceu morto naquele chão que a Tona se recusava a pisar. Nunca se soube a causa desse infortúnio.
A vida continuava para aquele espantoso pássaro no seio familiar que toda a atenção lhe dava. Era ver todos, especialmente o pai da família, em assobios histriónicos numa animada conversa com a Tona ou, muitas vezes, em autêntica competição sonora e melódica.
Poder-se-á dizer, mas afinal essa é a vida normal de um pássaro que está numa gaiola. Está lá porque os donos gostam de o ver e de o ouvir. Talvez com esta velha piriquita houvesse mais qualquer coisa. Ela julgaria ter a dimensão de uma guardian de templo. Talvez para ela, aquele lar e aquela família fizessem parte de um templo que merecia ser guardado. Talvez para ela, todos aqueles que lhe davam atenção, eram deuses de um Olimpo que ela própria imaginou e do qual também fazia parte.
Os donos insistiam na ideia de que a solidão de Tona, apesar de esta se expressar muito alegremente, deveria ser preenchida mais uma vez. Outro companheiro foi fazer parte do quotidiano daquele singular pássaro. Mais uma vez, também este caiu morto. Mas agora havia vestígios de alguma violência. A Tona, interpretaram os donos, queria estar só e exclusivamente para eles. Queria para ela toda a atenção deles, retribuindo assim também a sua plena atenção para com os seus donos. Provavelmente, e de uma forma fria, eliminou, com fortes bicadas, o seu companheiro.
Mas isto é o reino dos animais e, como no mundo dos homens, também por vezes o mais forte é o mais injusto. Por opção, a piriquita Tona passou a viver definitivamente só, ou do seu ponto de vista, talvez não. Afinal vivia com aqueles humanos que lhe davam toda a atenção do mundo, daquele seu mundo que, sendo pequeno, era enorme.
Passaram-se muitos e muitos anos e a piriquita foi envelhecendo, ao mesmo tempo que o seu corpo se ia deformando. Sem as forças e agilidade de outros tempos, Tona continuava a cantar, embora sem o mesmo brio, para continuar a ter a atenção dos seus donos. Nas suas deslocações, bastante mais limitadas, que lhe permitiam chegar à comida e à água, a velha piriquita fazia autênticos números de circo, mas em grande sofrimento. Era uma grande lutadora. Um dia percebeu haver alma nova, que não ela, naquela casa. De facto tinha nascido um menino no seio daquela família e as atenções passaram a ser-lhe dirigidas. Triste, deixou-se envelhecer ainda mais, esquecendo-se que o seu dono, que a provocava para o canto, também ele envelhecia.
Foi esta solidariedade no envelhecimento de ambos, de todos afinal, que lhe mostrou que ela também é da família e, que se morresse, todos os seus donos sofreriam com essa perda.
Assim a história ainda continua e perdurará para além das memórias. Todos estão vivos esperando serenamente o seu fim, que será, seguramente, diferente no tempo e no espaço, para cada um dos que constituem aquela família a que a Tona afinal também pertence.
Para o meu neto Manuel - 10 de Fevereiro de 2007

PS: A Tona, sem a vivacidade e a cantoria que a tornavam única, acaba de partir, voando ainda mais alto, na direcção do horizonte onde todos os seres têm um lugar, que não sendo eterno, é profundo: a saudade.

06 janeiro 2008

VENHAM MAIS BLOGUES

O comediante Bruno Nogueira dizia numa entrevista, a propósito de uma entrada sua em antena num programa de rádio onde chamava “boizinhos” ao auditório, ser o humor Poder. O humor é apenas humor e mais nada. Será um bom humor se for crítico, sarcástico, irónico, mordaz, prazenteiro, divertido e, sobretudo, partilhado. Se não tiver nada disto, então é ridículo ou apenas uma tragi-comédia.

Poder é Poder e ponto final!

Mas a ideia de Poder está, infelizmente, associada quase exclusivamente aos corredores da decisão política e à concentração nalguns da riqueza ou da actividade económica.

O Poder também pode estar nas nossas mãos, em cada um de nós, quando, conscientemente, amamos a liberdade e lutamos por ela, admiramos a grandeza de espírito e tentamos interiorizá-la, apelamos à paz e defendemo-la.
O Poder não pode estar só nas mãos dos privilegiados, dos iluminados, dos senhores e dos ricos, enfim, nas elites. Deve estar também naqueles que procuram a igualdade de oportunidades; naqueles que querem ter uma vida digna e humana; naqueles que procuram instruir-se, educar-se, cultivar-se; naqueles que são discriminados; naqueles, afinal, que são a maioria.

Há quem impeça, advogando um direito seu, justamente o Poder de ser omnipresente, insinuando que nem todos podem ter o Poder, como seja o direito de escolha. É o que faz Pacheco Pereira no seu artigo “Cultura do blogue nacional” de sábado, 29 de Dezembro de 2007. Pacheco Pereira é alguém por quem tenho alguma admiração, na maioria das vezes não tanto pelo que diz, mas mais pela forma como o faz, com irreverência e alguma coragem.

Caramba! Já não se pode ter um bloguezito! Claro, o blogue é para escrever o que vai na alma, criticando ou valorizando o que observamos, o que sentimos, o que partilhamos, ou que não partilhamos e queremos começar a partilhar. Qualidade? Este conceito também não é propriedade das elites. Claro que existe qualidade nos blogues, bastante até, como também a ausência dela é notada. Mas também não abunda assim tanto junto das elites, dos privilegiados, daqueles que constroem “novos corredores de Poder” ao imporem-se desmesuradamente no nosso quotidiano através dos media.

Por não haver hábitos de leitura, sobretudo na juventude, este instrumento ao democratizar-se promove esse e outros hábitos de socialização, de crescimento e desenvolvimento cultural. Junto dos mais velhos, como eu, constrói-se a oportunidade de recomeçar sempre de novo, inserindo-se em comunidades com interesses comuns, procurando registar emoções, porque não? Mas também por Poder criar espaços de criação e divulgação de ideias, escritos e outras dimensões que a criatividade humana permite, sendo certo que para todos, felizmente, o blogue é, definitivamente, um dos instrumentos mais democráticos que está ao nosso alcance e só temos de rentabilizá-lo dignamente em nosso (individual e colectivo) proveito.

Partilho de algumas preocupações de Pacheco Pereira quanto a alguma utilização menos nobre deste instrumento, mas as relações humanas, independentemente de um blogue, são mesmo assim. A dimensão educativa, na família e na escola, tem um papel fundamental. É preciso assumi-la na plenitude junto dos mais jovens, sugerindo-lhes metodologias próprias para a sua relação com este instrumento, para permitir-lhes também melhorar a qualidade da sua intervenção no blogue e, portanto, na sociedade.

Por isso não me assusta o aparecimento de mais blogues nacionais pelo universo da net em Portugal. É sinal de vitalidade, é a assumpção plena de cidadania. Afinal a vontade de conquistar o direito e a igualdade de oportunidades, de vivência e socialização universal.

Enfim, é a forma de, paulatinamente, o cidadão comum mostrar que vai tendo mais Poder, sobretudo o Poder de criticar e de propor as mudanças socioculturais a que tem direito por dever de uma cidadania plena.

01 janeiro 2008

EXIGIR EM VEZ DE DESEJAR

No ritual de passagem de ano confortamo-nos e conformamo-nos com os votos e desejos para que tudo do melhor aconteça na nossa vida pessoal, profissional e colectiva. É um ritual de esperança que nos leva a promover expectativas a maioria das vezes adiadas.
Quero quebrar essa tradição e dizer BASTA à ideia de votos e desejos abstractos, transformando-a numa ideia mais interventiva, isto é, definitivamente de exigência.

Tanto na vida privada e, sobretudo, na vida colectiva, estas expectativas não se traduzem em coisas concretas, quando deveriam concentrar-se afinal naquilo que é mais emergente no desenvolvimento social e cultural das comunidades e das regiões mais periféricas: o crescimento demográfico e o rejuvenescimento das populações, a implementação e valorização de processos de auto-estima individual e colectiva, a criação e oportunidades de trabalho, de estudo, de socialização, enfim, de encontro com o Bem-Estar Social tout-court.
O Alentejo, segundo o Jornal PÚBLICO de Sábado, 29 de Dezembro passado, irá beneficiar de 7500 milhões de euros para serem investidos em PIN (projectos considerados pelo Governo de Potencial Interesse Nacional), como por exemplo num aeroporto em Beja, em auto-estradas a caminho do complexo de Sines, numa escola profissional de turismo em Portalegre, numa fábrica de aviões em Évora e em 16 mil postos de trabalho.

A perspectiva é boa e peca por ser tardia. O Alentejo tem vindo a esperar a sua oportunidade de crescimento, pelo menos, nos últimos 20 ANOS. Até agora muito pouco ou nada se fez.
O Alentejo tem vindo a desertificar-se, envelhecer e a empobrecer, piorando significativamente a qualidade de vida dos que ainda por aqui vão ficando, nomeadamente pelas más condições dos serviços de saúde, pela ausência de apoios à modernização das escolas e dos espaços públicos de socialização cultural, artística e social, pela ausência marcante da solidariedade nacional, pelo desinteresse no investimento de um ensino superior público que progrida numa dimensão de excelência em todas as áreas do conhecimento, das técnicas e das tecnologias mas, sobretudo, pelo desencanto dos alentejanos e de todos os outros, de outros lugares, que como eu faz dele a sua terra. Apesar de tudo, este desencanto projecta-se na raiva que se transforma em ganas de lutar e de exigir, a partir da implementação de projectos e de espaços comunitários em emergência.

Desculpem-me senhores do Poder (Central e Local também, naturalmente), esta mensagem sendo para vós, que ocupam hoje o Poder, não deixa de ter também um carácter retroactivo para todos os Poderes que se instalaram neste País desde 25 de Abril de 1974 e que pouco fizeram por esta e outras regiões do interior do País.

Não vou desejar nada porque os senhores, uma vez mais, poderão não cumprir. Mas vou exigir para que se decrete a emergência de uma discriminação positiva para o Alentejo, através destas medidas agora anunciadas e outras, muitas outras, absolutamente inadiáveis.

Exijo, eu e muitos milhares de portugueses e de portuguesas e de outros cidadãos que connosco partilham o espaço e a esperança de um país melhor. Esta exigência assenta na legitimidade que nos assiste dada pelo cumprimento dos nossos deveres de cidadania: pagamento de impostos, cumprimento das leis e de outras normas que nos fazem ser cidadãos exemplares. Resta-nos agora usufruir dos nossos direitos de cidadania que, cumpridos, tornam o Estado uma pessoa de Bem.