24 fevereiro 2008

CAMINHOS DA ANIMAÇÃO

Parafraseando o título dos Encontros de ASC de Beja, o título deste post é exactamente o mesmo, porque é exactamente sobre os caminhos de animação que escrevemos hoje e que temos vindo a escrever ao longo destes dois anos, tempo de existência deste blogue.

Vamos, cada vez mais, encontrando maiores argumentos e, portanto, mais legitimidade para pressionar os poderes relativamente aos estatutos profissionais do Animador Sociocultural.

No âmbito da reflexão e discussão teórica sobre Animação:
Quando se institucionalizam os Encontros Regionais, Nacionais ou Internacionais sobre Animação.
Para este ano temos já calendarizado os Caminhos da Animação na ESE de Beja (http://caminhosdanimacao5.googlepages.com/home), o da ESE de Portalegre também irá decorrer em data a anunciar. Está também em marcha, para Abril, o I Congresso Internacional de ASC e os Desafios de Séc. XXI em Ponte de Lima (http://www.animacaodesafiosecxxi.com/) e, para Novembro, o Encontro Regional da Madeira (http://animasocioculturaleinsularidade.blogspot.com/).

No âmbito da carreira profissional:
Hoje os Animadores trabalham por muitos espaços de intervenção sociocultural. Desde Câmaras a IPSS, de Escolas Básicas a Unidades de Produção Artística, de Projectos de intervenção Comunitária e Local a Projectos de Desenvolvimento Cultural de âmbito Nacional, etc. Existem animadores já responsáveis por Instituições, como existem já animadores a leccionarem no ensino superior.

Relativamente a esta última questão fiquei bastante contente por encontrar e contactar com um licenciado em Animação Sociocultural e creio que já mestre, o Mário Montez, a leccionar na ESE de Coimbra e a fazer parte de um Projecto de Desenvolvimento de âmbito nacional, como é o caso do E-Qual, do qual também participo com mais pessoas e instituições.

A Animação Sociocultural do Séc XXI passa indubitavelmente por esta questão.
Se assim não for estamos a afastar, cada vez mais, a função e o perfil do profissional de ASC das práticas de Animação e a dar sinais epistemológicos de que o seu carácter polissémico dispensa um dos protagonistas dessa função, o Animador. Ao mesmo tempo estamos a admitir que esta função poderá ser desempenhada, formal, institucional ou voluntariamente por qualquer outra formação e que a formação específica não faz sentido.

De certa maneira esta questão está já implícita no discurso de algumas universidades, digo, professores com responsabilidades nas mesmas, quando argumentam não ser a Animação Sociocultural um curso de competências universitárias. Quando muito poderá ser de competências técnicas, reenviando essa formação para os Politécnicos. Concordo em absoluto, mas então não abram também cursos de animação. Ao fazê-lo estão ostensivamente numa concorrência desleal para conquistar públicos e aumentar a rácio de alunos nas suas instituições.

No contexto político actual, não pressionando o poder, estamos a induzir ao argumento de que esta formação não faz sentido e que não é prioritário investir em cursos desta natureza, justificando assim a redução de custos e meios.

Esta é uma prática política que temos vindo assistir em muitos campos de organização da nossa sociedade. Esta é uma prática política que vai fragilizando cada vez mais o conceito de cidadania e o seu corolário que é o direito das pessoas serem protagonistas do seu próprio desenvolvimento.

Afinal esta é uma das funções da Animação Sociocultural e dos Animadores. Contribuir e ajudar a construir o direito pleno de cidadania das populações. Não deixemos cair este princípio, lutemos por ele.

17 fevereiro 2008

TESTEMUNHO*

Hoje quero falar-vos de uma MULHER com letras maiúsculas! Discreta, sensível, generosa, empreendedora e solidária. Quero falar-vos hoje, neste programa, de Piedade Murta. Nada de natureza política me move a tomar esta iniciativa. Apenas a minha admiração e reconhecimento pelas causas que defende.

Desempenha, actualmente, e na sequência de mais de dois mandatos à frente da instituição, o cargo de Provedora da Santa Casa da Misericórdia de Portalegre. Nesta função, como noutras que foi desempenhando ao longo da sua vida pública em Portalegre, nomeadamente o de Vereadora da Câmara Municipal de Portalegre e o de Presidente da Junta de Freguesia da Sé, evidenciou uma capacidade para liderar projectos e iniciativas que, para além de serem dirigidas às populações, permitiram criar nestas espaços de cidadania e de noção de protagonismo colectivo conducentes à melhoria da sua própria qualidade de vida.

A nossa relação, sendo de admiração e de respeito mútuo, aproxima-nos também por algumas cumplicidades, isto é, pela vontade comum de uma intervenção cívica junto das comunidades e pela constatação e necessidade emergente de um desenvolvimento local capaz de fomentar espaços de cidadania conducentes ao crescimento e desenvolvimento do indivíduo e do grupo ou da pessoa e das comunidades.

As suas competências, transversalmente enriquecidas pelos cargos e funções que desempenhou, permitem-lhe com toda a serenidade e, ao mesmo tempo, determinação, definir estratégias de afirmação da instituição que agora lidera. Apesar da Santa Casa da Misericórdia de Portalegre fazer parte de um acervo cultural nacional, que é o movimento das Misericórdias Portuguesas, houve tempo em que a designação de asilo de velhos esteve bastante entranhada na cultura do quotidiano das pessoas e, associado a isto, a ideia de que os velhos estavam ali para morrer. Porventura no comportamento de alguns dos familiares dos utentes deste tipo de instituições, essa ideia, ou melhor, essa comodidade de pensamento ainda possa emergir. Todavia tenho quase a certeza de que, pelos valores humanistas que orientam Piedade Murta, ela e a sua equipa farão sistematicamente um trabalho pedagógico no sentido de, paulatinamente, irem alterando esta forma de pensar e de actuar.

Os anos à frente desta instituição, mais as suas competências técnicas e humanas, têm levado a eliminar este estigma e a transferir a Santa Casa da Misericórdia para um patamar, que não sendo de excelência, associado sobretudo a recursos materiais e humanos de luxo, é um patamar de assunção da dignidade e de respeito pelos utentes que beneficiam destes espaços de solidariedade. Com isto não quero dizer que outros provedores que antecederam Piedade Murta tivessem descurado esse bem-estar e essa qualidade de vida traduzidos em afectos e apoios existentes naquela instituição. Porventura a determinação de Piedade Murta tem sido mais mobilizadora de vontades e de sinergias em prol da melhoria das condições de vida das pessoas. Naturalmente que muito há por fazer, envolvendo vontades e meios. Os apoios oficiais e privados, os mecenas e a solidariedade da própria comunidade poderão transformar a Santa Casa da Misericórdia de Portalegre numa instituição de solidariedade social de referência na cidade e na região.

O conjunto de iniciativas levado a cabo no decurso do ano passado, e que continuam este ano, assim como o conjunto de outras actividades e valências a iniciarem este ano noutros espaços físicos da Instituição demonstram, claramente, uma intenção de mudança. O apelo sistemático solicitando a participação das populações nestas actividades só revela, da parte de Piedade Murta, um interesse crescente pelo envolvimento das populações nestas instituições, consciencializando-as para as dinâmicas da participação e da socialização, ao mesmo tempo que se desenvolve a reconstrução dos valores da solidariedade e a vontade de encontro de uma nova justiça social onde todos nós, para além do Estado, temos responsabilidades.

Piedade Murta é assim, para mim, o paradigma da entrega voluntariosa e o paradigma da mulher que se constrói pensando nos outros.
* Testemunho lido a 15 de Fevereiro de 2008 na antena da Rádio Portalegre inserido numa rubrica "Crónicas de Hoje" onde participo quinzenalmente às 6ªs feiras.

11 fevereiro 2008

SE HOUVESSE O ENCONTRO QUE PROPONHO, ACREDITO QUE EXISTIRIAM MUDANÇAS

Certamente que as pessoas que não me conhecem, já se aperceberam, pelas “Crónicas de Hoje” que mantenho regularmente na Rádio Portalegre, que o meu objecto de reflexão permanente é a Cultura, a Arte e a Educação. Tem a ver com dois caminhos que tenho vindo a percorrer ao longo da minha já média existência: a profissional e a académica. A minha insistência na reflexão sobre esta problemática surge apenas porque entendo que, quer do ponto de vista institucional, quer do ponto de vista individual e colectivo, Portalegre tem algumas condições, salvaguardo aqui a referência a outras inexistentes enunciadas na minha última “Crónica de Hoje”, para se afirmar como uma cidade e concelho eminentemente cultural, envolvendo o potencial e as vontades da sua população de origem, mas também daqueles que fazem da cidade e da região a sua terra.

Gostaria de referir a insistência de algumas mentalidades que reivindicam sistematicamente a emergência das oportunidades para os portalegrenses, referindo-se exclusivamente aos “filhos da terra”, expressão aliás bastante usada. Não estendo nem generalizo à população no seu conjunto este meu sentir, esta minha frequente constatação. Está muito mais centrada naqueles que têm o privilégio do espaço e do debate público. É uma afirmação provinciana com laivos de algum chauvinismo. Afinal, os portalegrenses somos todos nós, os que nasceram cá, os que não sendo de cá, vivem e trabalham em Portalegre e, naturalmente, a diáspora. Esta observação, apesar de relativizá-la, não deixa de evidenciar alguma discriminação e desencontros entre todos aqueles que, de uma forma ou de outra, querem ver a cidade, o concelho e a região evoluir.

Assim, a este propósito, gostaria de lembrar que no espaço de pouco mais de um mês saíram do prelo três livros produzidos em Portalegre: Crónicas Lagóias - Um auto-retrato e Outros Instantâneos de António Martinó de Azevedo Coutinho, editado pelo Instituto Politécnico de Portalegre (IPP); Jornadas Sobre Investigação - Comunicações e Posters, resultantes de um Encontro sobre Investigação concretizado o ano passado pelo IPP, a propósito de investigações levadas a cabo por um considerável número de professores de todas as suas Escolas Superiores. Uma edição também do Instituto Politécnico de Portalegre; finalmente, no sábado, 26 de Janeiro de 2008, foi lançado um livro de poesia, ou melhor dizendo, de não-poemas segundo o autor Carlos Garcia de Castro, com o título Gloria Victis - Não-Poemas, editado pelas Edições Sempre-em-pé.

O lançamento, com sessão de autógrafos pelo autor, realizado no Instituto Português de Juventude, foi um momento muito interessante porque permitiu uma ponte entre duas áreas artística: a música e a poesia. O projecto musical de António Eustáquio e dos seus companheiros, que num momento simbólico permitiu homenagear o nome de Carlos Paredes a propósito da presença de Luísa Amaro, teve o mérito de criar uma atmosfera de conversa informal, do autor com amigos e conhecidos aí presentes, assim como permitiu leituras poéticas ao vivo. A sessão foi interessante também pelo discurso informal de Carlos Garcia de Castro, todavia um pouco longo, a propósito da relação da vida com a morte e da interacção do autor com os outros, por vezes truculenta, que lhe advém do seu estatuto de senador. Citando o autor: “A minha idade é já de senador. Classicamente quer dizer, sou velho.”

Este momento, quer pela articulação das duas linguagens, a música e a poesia, quer por algumas afirmações de Garcia de Castro, a propósito de um conjunto de pessoas, nomeadamente de jovens, que se empenharam na organização do evento, valeu por algumas ilações que eu gostaria de tirar.
A um determinado momento Carlos Garcia de Castro nomeou um conjunto de pessoas de Portalegre que, como ele, têm percorrido um caminho na vida cultural desta cidade. O nome que registei particularmente foi o de Nicolau Saião, por ser uma personalidade que marca, com muita pena minha, uma ausência constante nestes pontuais momentos da vida cultural de Portalegre.

Num dos últimos post do ano de 2007 editei, neste blogue, uma Carta Aberta a Nicolau Saião procurando saber o que era feito de si, da sua obra e da sua presença. Fi-lo porque conheço um pouco a sua obra de poeta, de ensaísta e de pintor e também porque li, e leio regularmente, uma Revista Electrónica que vem do Brasil chamada AGULHA, local onde se encontram alguns dos seus ensaios, bastante interessantes, sobre literatura e arte. A resposta não se fez esperar. Viva, inteligente e acutilante. Manifestou-se desinteressado por uma presença sua na cidade, por considerar esta um pólo de interesses particularizados, restritivos e discriminatórios. Deu para perceber existirem algumas desilusões e desencontros.

Era aqui que eu queria chegar. Numa população que vai ficando cada vez mais senadora, nas palavras de Garcia de Castro, valerá a pena existirmos cada um de per si, em percursos e projectos cada vez mais isolados, construídos apenas para o nosso ego ou eventualmente só para o exterior? Não chegou o momento de fazermos contas do que vai ser o nosso futuro colectivo e comunitário, trabalhando por uma causa que constitui o paradigma de um novo desenvolvimento local e em que todos nós temos o compromisso de sermos protagonistas dessa mudança? Não terá o nosso exemplo um efeito negativo que leva os mais jovens a não estarem presentes ou simplesmente a emigrarem ou imigrar?

Se o evento de sábado, 26 de Janeiro de 2008, juntou áreas da arte e da cultura, como a música e a poesia; se outros exemplos esporádicos vão surgindo, lembro um projecto profundamente comunitário e cultural, o Flautista, levado a cabo há uns anos pela Companhia de Teatro de Portalegre e que envolveu toda uma população e todos os grupos culturais da cidade e do concelho, então é porque existe latente uma vontade colectiva de nos empenharmos na mudança e na criação de novas oportunidades para a afirmação cultural e artística de Portalegre, cidade e concelho, mas também da região.
Falta-nos naturalmente pontes de interacção e, seguramente, pontos de contacto. É aqui que a ausência de uma política cultural se faz sentir.

Os responsáveis de Grupos, de Associações Culturais e Artísticas, de índole profissional e amador, e pessoas, individualmente, que já afirmem projectos ou que gostariam de ter oportunidade de o fazer, deveriam estar disponíveis para um espaço da reflexão, de debate, mas também de reconciliação. Acredito que um Encontro sobre “Que cultura para Portalegre?” envolvendo os elementos acima referidos, mas também responsáveis de organizações como o IPP, o Conservatório, a Câmara Municipal, assim como personalidades disponíveis para esta reflexão, permitirá que, olhos-nos-olhos, se discuta o que é urgente fazer em matéria de desenvolvimento cultural para a cidade e concelho de Portalegre. Estou seguro também que, o estarmos de costas voltadas uns para os outros, não nos permite ser cidadãos de referência e, muito menos, nos permite entender e consciencializar uma cidadania plena de que não devemos abdicar.

03 fevereiro 2008

ANIVERSÁRIO

Há exactamente dois anos, por esta altura, estava a iniciar o meu blogue sob a orientação do meu filho Pedro. Questionava-me se seria capaz de cumprir, e manter com regularidade, reflexões breves sobre Animação, Arte e Cultura. Exceptuando os meses de Agosto, reparo que tenho mantido, com regularidade, um post semanal, algumas vezes de maior especificidade relativamente a cada um dos campos acima referidos, outras vezes reflexões incidentes sobre a problemática da vida e do mundo, outras ainda de ordem mais intimista e pessoal.

Precisamente há dois anos aqui, neste lugar, lamentava com tristeza a partida do meu sogro e amigo Manuel. Também por esta altura, exactamente há um ano, rejubilava de imensa alegria com o nascimento do meu primeiro neto, o Manuel.

Nestes dois anos as margens do tempo foram estreitas para um leito tumultuoso da vida. Muitas coisas aconteceram. Umas boas, outras menos boas e outras ainda francamente más. Mas a vida é feita de encontros e desencontros, de ambições, de trabalho, de esperança, de desejos, de votos. O País evoluiu mas, paradoxalmente, também teve retrocessos. As relações sociais generalizaram-se, mas também aumentaram o seu campo de influências, constituindo por isso espaços de conflitualidade. Chegados aqui precisamos sempre de bom senso.

Contrariando os cépticos, ou as elites, que se recusam aceitar que este instrumento se democratize, e impedi-lo-iam se os permitissem, assumo claramente que na minha aventura de bloguista aprendi muito.

Antes de mais sou autónomo na utilização deste equipamento. Graças ao Pedro que, com paciência, soube entender os ritmos geracionais que nos separam em termos de aprendizagem. Ao mesmo tempo fui adquirindo uma disciplina que me permitiu a criação de mais um hábito sociocultural, isto é, permitiu-me entender o blogue como uma ferramenta de trabalho e de prazer. O compromisso do post semanal associado à sistematização na escrita. A apropriação da escrita na base de uma maior capacidade de síntese. Finalmente um compromisso que não está, nunca esteve aliás, descontextualizado da minha presença do mundo. Esse compromisso fez-me reatar, por esse mundo fora, relações de amizade e de companheirismo há muito descuradas pela preguiça da escrita da carta ou do simples telefonema.

Este blogue não dava um programa de rádio para a Rádio Comercial, porque não tem uma matriz de leituras curtas. Não daria também para escrever um livro ou até para fazer um filme, porque não tem uma narrativa coerente. É desconexo, às vezes desconcertante. Mas é o meu blogue. Graças a ele, e a mim sempre que queira, e quero por muitos anos ainda, estar em contacto com o mundo e com as pessoas, com o conhecimento e o saber, com a amizade e o amor, com a saudade e a esperança, com paz e a justiça social, com a solidariedade e com a fé.

Mas o meu blogue também existe, porque sei que há, do outro lado, muita gente que o lê. De Portugal, de outros países da Europa, dos Estados Unidos, do Canadá e também da América do Sul, especialmente do Brasil, da Argentina e do Uruguai. Para todos vocês estimados leitores, amigos, conhecidos e desconhecidos, lanço daqui um abraço fraterno de profundo reconhecimento.

BEM HAJAM.