23 dezembro 2007

HOJE É DIA DE SER BOM…

Parafraseando A. Gedeão mas sem a intensidade de ironia do poema “A Noite de Natal”, lanço um apelo aos Homens e às Religiões de todo o Mundo para encontrarem na sua Espiritualidade e na sua Fé capacidades para fomentarem um diálogo profundo em prol da PAZ.

Acredito na generosidade dos homens e das mulheres deste velho planeta, e na sua imensa disponibilidade, para praticarem uma ideia de mundo novo onde a justiça, a solidariedade, a fraternidade e o amor deixem de pertencer ao simbólico e passem a estar no quotidiano, no nosso quotidiano universal, como a assumpção de um novo paradigma: o de se ser uma espécie única, inteligente e voluntariosa.

Acredito que se deixe de pensar que é na atitude individual que se contribui para mudar o mundo. A ideia de “uma gota no oceano…” está ultrapassada. A mudança do mundo e das mentalidades tem de ser um projecto colectivo e à escala global, coordenada pelos responsáveis políticos, mas também, e fundamentalmente, pelas organizações não-governamentais, pelas associações comunitárias e depois pela quota-parte individual, que é no fundo estar disponível para essa contribuição.

Acredito, por isso mesmo, num mundo melhor, porque acredito nos homens e nas mulheres de boa vontade.

Aproveito para enviar votos de BOAS FESTAS E DE UM ANO NOVO PLENO DE FELICIDADES ao meu filho Pedro que em Nova Yorque também constrói o seu futuro, aos meus familiares espalhados pela Europa, a nossa Europa sem fronteiras, mas também a todos os meus amigos espalhados pela Europa, América Latina, Estados Unidos e Canadá.

Também a todos os meus amigos, familiares, ex e actuais alunos(as), colegas da animação, do teatro, da dança e da educação.

Finalmente extensivos à minha família nuclear. Para além do Pedro, do Sérgio, do Ivan e da minha esposa Ilda, dos meus pais e da minha sogra, dos meus irmãos, sobrinhos, cunhados e nora, também uma esperança de enorme felicidade, mais renovada ainda, para todas as crianças do mundo, simbolizadas pela existência do meu neto Manuel quase a fazer um ano de vida.

Sem deixar de me lembrar, e era injusto se não o fizesse, de todos os meus leitores anónimos espalhados pelo mundo. Obrigado por me escutarem. Bem Hajam!

O Ano Novo trará o reinício do nosso contacto. Obrigado

18 dezembro 2007

O MUNDO MARAVILHOSO DAS HISTÓRIAS DE ENCANTAR

Na minha infância ouvir contar histórias era absolutamente normal. Havia sempre uma avó ou uma ama que nos encaminhavam para o mundo do maravilhoso e do fantástico.

Eu tive o privilégio de ter ouvido as duas em contextos diferentes. Em casa da minha avó era o pretexto para a reunião da família, dos mais velhos com os mais novos, e todos cresciam com a essência de uma identidade e de uma cultura comum, aberta para a diversidade e para a universalidade.

Em casa da minha ama, a Mãe Camélia, era o espaço da aprendizagem e da partilha do saber e do conhecimento com os outros meninos e meninas, sentados em almofadas pelo chão ou em banquitos de madeira onde a aprendizagem formal se desenrolava através da individual pedra preta (ardósia) e da pena para a escrita e para o cálculo.

Também neste contexto, na casa da ama, tínhamos o privilégio de ouvir a rádio em períodos diferentes do dia. É interessante recordar a importância que este objecto tinha na nossa cultura do quotidiano. Para a ama, a audição das rádio-novelas e de teatro radiofónico feito por actores portugueses, emitidos pelo Rádio Clube Português e pela Emissora Nacional. Para nós, os outros, a expectativa da hora das histórias narradas e contadas em português, com sotaque, vindas do Brasil, emitidas semanalmente pelos Emissores Associados de Lisboa.

Não havia em Portugal a tradição de se gravar histórias contadas em português sem sotaque, pelo que aquele momento era único e apaixonante. Quando esse espaço faltava nós sentíamo-lo com muita intensidade.

Durante muitos anos o espaço tradicional das histórias esteve centralizado na família, passando para a área da educação quando a Escola se abriu mais à comunidade e ao mundo.

Nos últimos anos a Escola tem cumprido essa tarefa, mas tem vindo a transformá-la num espaço de aprendizagens formais. Com o boom das novas bibliotecas e museus criaram-se as horas do conto com dois objectivos: por um lado, a tentativa de criação de hábitos de leitura e, por outro, a animação pedagógica e lúdica desses espaços a partir de histórias contadas e dramatizadas. A impressão que tenho é a de que o acto de contar foi subalternizado, salvo algumas excepções, pelos momentos que lhe dão continuidade: o jogo, o lúdico, a dramatização e a leitura.

Também neste últimos anos cresceram os profissionais contadores de histórias que têm como objectivo recuperar e manter a tradição oral. São actores, professores, educadores, animadores ou gente que gosta de contar histórias simplesmente: os andarilhos da tradição oral. Este projecto partiu do individual para o colectivo, tendo hoje uma tradução significativa nos encontros de andarilhos anualmente em Beja.

Estas minhas memórias surgiram hoje aqui porquê? Porque achei interessante sobre o modo como as novas tecnologias poderão estar ao serviço do ler e contar histórias do maravilhoso e do fantástico, mas também do romance, do ensaio e por aí fora. Um artigo na Revista Actual do Jornal Expresso de 01 de Dezembro de 2007 dá-nos conta disso. Audiolivro é o novo conceito: “o resultado de uma gravação áudio de um livro, gravação essa apenas a uma só voz. Actores e autores são os principais narradores dos livros que se ouvem, aos quais dão uma interpretação pautada pela capacidade de contar histórias.” Curiosamente, dentro do artigo, há referências à História das histórias contadas e gravadas em disco, justamente com sotaque brasileiro, bastante ouvidas, segundo os autores, na década de 70. Pois é, muito antes, na década de 50, já eu as ouvia nos Emissores Associados de Lisboa.

Vale a pena reconstruir a história e os hábitos saudáveis. Era uma vez…

09 dezembro 2007

O TEATRO MUDOU A VIDA DELES

O conceito que as pessoas têm de Teatro, de uma maneira geral, é bastante restritivo. A ausência de políticas culturais e educativas concretas que institucionalizem formas da sociedade se relacionar com o Teatro e, por sua vez, deste se envolver com as comunidades através da criação de hábitos e de práticas culturais permanentes, leva a que o conceito seja reenviado quase exclusivamente para a prática teatral versus espectáculo de teatro.

Mas o Teatro, nas suas duas componentes Arte Dramática e Expressão Dramática, conceitos fundamentados pelo autor deste texto e deste blog em sede de doutoramento e cuja tese está publicada em livro com o título: Teatro e Animação - outros percursos do desenvolvimento sócio-cultural no Alto Alentejo; Colibri, Lisboa, 2003”, amplia toda uma praxis da acção teatral que vai da terapia à intervenção social, da educação à animação comunitária, da formação artística à produção do espectáculo, enfim, da assumpção das capacidades de expressão e comunicação individual e colectiva à criação da obra de arte tout court.

A minha experiência em redor do Teatro tem-se traduzido progressivamente, no espaço e no tempo, pela minha formação académica como actor/encenador, pela minha prática como actor/encenador numa estrutura normal de produção artística profissional, pela minha experiência de formador e animador teatral (formação de actores, bailarinos, professores e educadores, animadores socioculturais) e, finalmente, pelo meu percurso de quarenta anos como animador: cultural, comunitário, social, artístico e educativo.

Este percurso permitiu-me passar por todas as formas de abordar o Teatro, tal como refiro no 2º parágrafo deste texto. A experiência terapêutica, aquela que recordo profundamente, está associada à minha condição de ex-combatente na guerra colonial. Num primeiro momento, o período da comissão na Guiné propriamente dito, todo o esforço emocional, físico e psicológico, vivido em situações difíceis, foram ultrapassáveis graças aos momentos dedicados à prática teatral como actor/encenador e como animador teatral em plena campanha no mato. No segundo momento, o retorno à vida civil, todo o processo associado ao stress pós-traumático de guerra foi paulatinamente resolvido a partir da minha formação no Conservatório Nacional e da minha experiência como actor no Centro Cultural de Évora, hoje CENDREV.

A partir daqui a minha relação com o Teatro tem assumido essencialmente duas formas: a da formação artística, como artista e pedagogo, e da animação sociocultural, como animador, que utiliza o Teatro como um elemento fundamental na afirmação e socialização comunitárias e no desenvolvimento sociocultural local.

A razão desta minha reflexão está associada a um pequeno artigo publicado na Revista TVMais de 30 de Novembro e que diz respeito ao trabalho que um actor brasileiro tem vindo a desenvolver num bairro social em Lisboa. Aqui, os problemas da juventude são tantos, que a melhor forma de os consciencializar para a sua resolução foi envolvê-los, através do Teatro, numa maior participação social que valorizasse, em todos os sentidos, a dimensão colectiva e comunitária mas, sobretudo, que aumentasse a auto-estima individual capaz de determinar a acção e a mudança social.

Experiências desta natureza, isto é, a utilização do Teatro na intervenção social e comunitária, levadas a cabo por actores profissionais em Portugal são pouco significativas. Exceptuando algumas companhias de Teatro residentes fora de Lisboa, que o fazem mas que têm em vista a produção do próximo espectáculo, exceptuando algumas associações socioculturais despertas para esta questão, como a Crinabel por exemplo, que contratam actores profissionais para o desempenho dessas funções, exceptuando também alguns professores de Teatro dispersos pelo país que leccionam a disciplina de Expressão Dramática e Teatro no secundário, exceptuando enfim estes três grupos, pouco significativo é o papel do actor profissional que, envolvido na redoma de vidro da sua criação artística, esquece que há um mundo real cá fora que precisa também da sua outra forma de envolvimento. Porventura mais militante, porventura mais voluntariosa e, porventura, também um pouco mais generosa.

02 dezembro 2007

OS CAMINHOS DA FÉ

O encontro realizado em Roma há pouco mais de um mês entre os Bispos Portugueses e o Santo Padre terá contribuído para alguma alteração significativa da Igreja Católica em Portugal?

Foi notório no discurso de Bento XVI uma preocupação no sentido da Igreja fazer um esforço para se adaptar às novas realidades e ao mundo moderno. Consciente da perda de fiéis mas, mais ainda, do declínio das vocações sacerdotais que, em última análise, são eles que contribuem para o aumento de católicos praticantes em todo o mundo, o Papa sublinhou a importância dos bispos e dos sacerdotes poderem e deverem estar mais em contacto com mundo, com os fiéis e com aqueles que não o sendo, ainda o poderão vir a ser. Apelando aos valores da Fé e da Universalidade mostrou no seu discurso a importância de se praticar o culto da humildade e da não ostentação da riqueza material mas sim da riqueza espiritual.

O que temos vindo a notar no quotidiano, nalgumas práticas sacerdotais, mas também nalgumas funções episcopais, é uma certa distância e um pouco de presunção e água benta na forma como uns e outros se relacionam com as comunidades.

O sacerdote é um trabalhador da espiritualidade e o bispo um pensador na Fé. Será nesta articulação que a função religiosa deve ser cumprida em proximidade absoluta, em irmandade profunda.

Cada um de nós tem o seu tempo e espaço de reflexão espiritual. Cada comunidade tem o seu culto e as suas tradições calendarizadas no tempo e no espaço que definiu. Para ambos, as situações poderão ser alteradas em função de novos interesses e de novas necessidades.

Não dá para entender certos comportamentos de alguns clérigos; pela arrogância, pela distância que estabelecem com os seus paroquianos, pela atitude assumidamente divinal, como se eles fossem o próprio Deus. Isto acontece porque dificultam muitas vezes ou não chegam mesmo a realizar casamentos ou baptizados, apenas porque um dos protagonistas desses eventos é comunista, ou não é casado ou baptizado pela Igreja, ou porque, simplesmente, é toxicodependente ou gay. Enfim, existem atitudes diversificadas que não ajudam em nada a causa da Igreja e, muito menos, ajudam a Igreja a credibilizar a Fé e a aumentar o número dos seus crentes.

Então há horas para morrer? Um senhor padre, de uma paróquia do Alentejo, não quis hoje fazer o funeral de uma pessoa por quem eu tinha uma grande estima, porque tinha muitas missas marcadas… Amanhã também não o poderá realizar porque tem outros afazeres!

Com que indignação poderá ficar aquela família, crente, quando necessitava de ajuda espiritual e acompanhamento para o seu ente querido e lhe foi recusado com desculpas que não lembram aos céus. Recusas que ajudam a desmistificar as crenças e a desacreditar a própria Fé. Mais ainda com a ajuda de quem a deve praticar e difundir.

Situações destas ou análogas acontecem mais vezes do que deveriam acontecer. Os padres e os bispos são homens e erram como qualquer mortal. Mas têm uma responsabilidade acrescida: o de serem melhores homens e melhores mortais, justamente porque falam da imortalidade.

A imortalidade dos afectos e das memórias, para a família e amigos do senhor José António Pombo, de Assumar, ficará sempre escrita na história de cada um deles. Pelo que deram mas, sobretudo, pelo que receberam. Apesar do padre não cumprir as suas responsabilidades espirituais, éticas e morais, não celebrando a missa de corpo presente e não acompanhando o féretro até à sua última morada, os cristãos, esses, cumpriram o seu ritual de amor, de fé e de universalidade.