30 dezembro 2008

O ministro da Cultura e a sua comissão liquidatária

Fui sempre solidário com o Carlos Fragateiro. Somos amigos e colegas desde o Conservatório e do Mestrado em Montréal, já lá vão trinta e cinco anos. Porque o conheço, sei das suas competências e da sua honestidade.
Acreditei sempre no projecto que ele preconizava para o Teatro Nacional D. Maria II, o qual tive oportunidade de comentar algumas vezes neste blog. Por continuar a ser merecedor de credibilidade da minha parte e pela amizade que nos liga, atrevo-me a publicar este artigo que me foi enviado pelo próprio Carlos Fragateiro, publicado no entanto pelo Jornal Público de Sábado passado .

"A comissão liquidatária e o ministro estão mais interessados num acerto de contas do que num projecto que sirva o país. O Teatro Nacional D. Maria II está parado, como tantas vezes esteve na sua história, mas o senhor ministro da Cultura conseguiu tempo na sua carregada agenda para fazer uma visita detalhada e falar pessoalmente com a maior parte dos trabalhadores. Uma visita que foi um acto de cumplicidade com a administração, como tentou mostrar cumplicidade nas conversas que foi tendo com os diferentes responsáveis de cada sector, que acabavam inevitavelmente com a afirmação de que contava com eles para ajudar o teatro, mesmo se dois dias depois as responsáveis pelas áreas da comunicação e dos públicos, no meio de grandes elogios e de promessas de cartas de recomendação, são simplesmente despedidas.
É assim que vão as coisas no Dona Maria, onde o conselho de administração, incapaz de tomar decisões artísticas, toma decisões administrativas.
Os despedimentos são significativos, mas muitos deles não são feitos com o objectivo de racionalizar o quadro de pessoal, mas sim de preparar a entrada para os postos-chave do teatro de pessoas de confiança da administração ou do futuro director artístico. Uma situação cada vez mais turva onde, sem a nomeação das tutelas, Finanças e Cultura - uma nomeação que erradamente o senhor ministro dizia que era da responsabilidade do conselho de administração -, assinou um contrato como assessor de programação da administração o actor Diogo Infante, futuro director artístico ao que parece, com um vencimento superior ao de presidente do conselho de administração, a que se juntou mais um contrato de uma assessora que é adjunta do assessor, a actriz Natália Luísa.Enquanto isto, e numa altura em que se pretende afirmar Lisboa e Portugal como uma plataforma internacional no domínio do encontro e cruzamento de culturas, deixaram-se cair:- a participação do Dona Maria nas comemorações dos 200 anos da chegada da corte ao Brasil;- a participação de criadores portugueses na produção do texto que ganhou o concurso de dramaturgia António José da Silva que acabou de estrear no Brasil;
- o projecto Nação Crioula, de José Eduardo Agualusa, que cruzaria criadores do Brasil, Angola e Portugal;
- a montagem, com o grupo Gungu de Moçambique, do texto Viagens, de Mia Couto;- a continuação da colaboração com os Fidalgos da Guiné-Bissau;
- a criação de um grande fresco sobre a guerra colonial, da autoria do escritor Carlos Vale Ferraz, encenada pelo António Pedro Vasconcelos;
- a continuação da carreira de Tanto Amor Desperdiçado, de Shakespeare, produção luso-francesa que, depois da ida ao Festival de Nápoles, foi convidada para ir a Moscovo em 2010, e a integração numa rede europeia que inclui parcerias de cidades como Madrid, Paris, Nápoles, Manchester e Sibiú;
- a co-produção com a companhia da encenadora luso-canadiana Paula Vasconcelos, sobre o Idiota, de Dostoievski, a estrear em Montreal, em Novembro de 2009.É pena, mas a comissão liquidatária e o senhor ministro estão mais preocupados com o acerto de contas e a conquista de espaço e de lugares nesta nossa paróquia do que num projecto que sirva o país e o reforço da internacionalização dos nossos projectos e da nossa língua. Entretanto, Jorge Silva Melo e os outros artistas que assinaram os manifestos estão hoje silenciosos, mesmo quando se fecham teatros como o Villaret, uma sala para as dramaturgias contemporâneas, e a Politécnica, para os novos criadores e para os projectos mais experimentais, ou quando no primeiro dia de ensaios se anula a produção do Libertino, de Eric-Emmanuel Schmidt, com encenação de Fonseca e Costa.
Carlos Fragateiro - 2008-12-27 -
Professor universitário"

23 dezembro 2008

BOAS FESTAS E FELIZ ANO NOVO


O Ano de 2008 não tem sido fértil de bons momentos. Os conjunturais e globais que ameaçam continuar com intensidade provocando eventualmente uma nova era civilizacional e os pessoais que passam pela dor nos afectos, o que nos leva a estar familiarmente mais unidos.

O Natal deveria ser sempre. Todos os dias. Mas o ritmo da sociedade e as variáveis que determinam novas conjunturas só nos levam a pensar nos outros nesta quadra. O nosso individualismo não nos defenderá dos desafios com que nos vamos deparar. Aqui, os valores humanos têm de estar presentes todos os dias. A emergência da Solidariedade e da Paz como valores absolutos.

Com isto quero afirmar uma ideia que conjugue os votos de um Bom Natal de 2008 com uma felicidade construída por todos para o Ano Novo de 2009. Eu sei que não vai ser fácil para todos nós mas, seguramente, vai ser ainda mais difícil para muitos, a maioria naturalmente.

BOAS FESTAS E FELIZ ANO NOVO

18 dezembro 2008

UM FUZILEIRO NO SERTÃO












Ontem, no Museu da Marinha em Lisboa, no majestoso Pavilhão das Galeotas, foi apresentado o livro “Um Fuzileiro no Sertão” de autoria do Comandante Carlos Juzarte Rolo, com a chancela da Comissão Cultural da Marinha. A apresentação foi feita pelo Prof. António Ventura.

Estiveram presentes muitas pessoas, entre amigos pessoais de Carlos Rolo e antigos camaradas da Marinha, alguns dos quais, hoje, almirantes e Contra-Almirantes.

O livro narra-nos, na 1ª pessoa, a aventura de Teotónio Juzarte, fuzileiro da Armada Portuguesa ao serviço do Rei D. José I.

O meu amigo Carlos Rolo apropriando-se do discurso do cronista presente nas aventuras deste fuzileiro, narra-nos numa escrita ligeira e poética, de alguém que conhece bem os segredos do mar, o percurso deste marinheiro de Monforte, entre as entradas e saídas pela barra de Lisboa onde, numa das vezes, se confronta com o cenário dantesco do terramoto de 1755.

Mas a grande aventura e importância deste marinheiro está reservada de facto para uma estratégia real, de aprofundamento militar e desbravamento do território, em pleno sertão brasileiro.

Curiosamente e porque habito em Fortios há mais de 20 anos, fica-me também a satisfação de saber, num pequeno apontamento do livro, um pouco mais da história desta antiquíssima povoação distante de Portalegre 8Km. A Participação de Portugal na Guerra dos Sete Anos iniciada em 1762, fica conhecida pela Guerra Fantástica, onde Teotónio Juzarte também esteve envolvido. Entre a tentativa de várias invasões, Fortios foi um baluarte de defesa da cidade de Portalegre.

A apresentação desta obra, para além do significado histórico que o livro veicula, sobretudo para a Armada Portuguesa e para os Fuzileiros em particular, acentua também a dimensão humana do Carlos Rolo, traduzida pela presença de dezenas de amigos(as).

Gostaria de referir algo que traduz, ainda, a existência de valores e de afectos profundos e que me emocionou bastante. Carlos Rolo na sua breve alocução dirigiu-se, no início e no final da mesma, aos presentes no evento por esta ordem: Mãe, Senhores Almirantes, Minhas Senhoras e Meus Senhores.

Meu amigo parabéns e obrigado por este grande trabalho de investigação e pela linguagem literária e poética com que me surpreendeste.

16 dezembro 2008

SALUDO NAVIDEÑO RIA



Pelo seu significado simbólico e pelo facto desta mensagem ser dirigida a um universo amplo, mas restringido aos elementos da Rede Ibero-americana de Animação Sociocultural, não quis deixar de partilhar o seu conteúdo com todos os animadores socioculturais do país e do mundo.






Amig@s y compañer@s de RIA:


Aunque confieso que no soy muy amigo de contribuir a engrosar la tradicional avalancha de convencionales mensajes navideños que se nos suelen avecinar por estas fechas, tampoco puedo dejarlas pasar sin ponerme en contacto con vosotros aunque no sea más que para compartir esta confidencia que en el fondo no es más que una reivindicación para que el espíritu de la Navidad, deje de reducirse a un superficial repertorio de manidos mensajes coyunturales, para transformarse en un talante de permanente y auténtica apuesta por el otro como fuente de nuestra propia plenitud.

Esto creo que está en la base de la animación y de los animadores y animadoras que, por encima de diferencias, idiosincrasias y lugares pretendemos tejer una Red a partir de los hilos que nos unen en cultura, lengua y amistad pero también ribeteada con los hilos que nos distinguen y por ello también nos enriquecen y fortalecen.
A punto de cumplir un año más de existencia hemos alcanzado un conjunto de logros sumamente importantes que nos animan a redoblar esfuerzos para continuar creciendo de cara al próximo 2009. Permitidme que subraye alguno de los más significativos a modo de balance de fin de año:

Hemos incrementado significativamente el número de miembros y allegados a nuestra Red tanto desde el punto de vista personal como institucional.
Hemos sido capaces de lanzar varios números de nuestra Revista "Animador Sociocultural", tanto en edición digital como impresa, así como nada menos que 4 libros (recordar que nos propusimos llegar a 2 por año) de nuestra Colección RIA que han llegado a múltiples rincones de nuestra Comunidad Iberoamericana a ambos lados del Atlántico, con una buena acogida en el exigente mercado editorial y de lectores.
Hemos realizado con pleno éxito nuestro 2º Congreso Iberoamericano de ASC, a pesar de haber tenido que frontarlo en poco tiempo y en circunstancias adversas como sabéis.
Hemos logrado poner las bases de nuestra RED DE NODOS asociada a sus correspondientes espacios virtuales propios que en adelante multiplicarán exponencialmente el alcance de la RIA a partir de su inmediato lanzamiento que queremos iniciar mediante un Foro electrónico al que convocaremos próximamente a todos sus coordinadores y delegados.
Hemos conseguido los recursos financieros indispensables para mantener el funcionamiento de nuestro espacio y herramientas virtuales, así como la contratación a tiempo parcial de una secretaria que atienda las tareas administrativas cotidianas indispensables para seguir avanzando y creciendo.
Hemos contribuido a difundir, apoyar o auspiciar multiples eventos de ambos lados del Atlántico directa o indirectamente relacionados con la RIA y sus miembros.
Y, lo que es más importante, tenemos una buena mochila cargada de proyectos que hemos preparado en nuestra reciente Videoreunión de Junta Directiva de RIA. Es nuestro equipaje listo para iniciar la andadura del 2009 y queremos a la vez que sea nuestro mejor regalo a compartir con todos vosotros para el nuevo año en el que necesitaremos de todo vuestra energía y colaboración.

Felicidades compartidas para estas Navidades pero también para todo el año y un gran abrazo fraterno y extendido a tod@s los que compartis camino y sueños en la RIA.

Víctor J. Ventosa
Presidente de la RIA

e

Miguel Blasco
Responsable Area de Comunicaciones

14 dezembro 2008

HÁ SEMPRE UM MOMENTO PARA A MUDANÇA

Não é apenas por não ser natural de Portalegre.
É também porque me sinto portalegrense.
É esta a razão que não me leva a comungar de um certo discurso e cultura provinciana existentes em muitas cabeças pensantes ou pseudo-pensantes, mas existentes também nalgumas organizações e meios de comunicação social, sobre a praxis de uma gratuita “cultura de apreciação”.

Poderia dar alguns exemplos que ilustrariam esta minha crítica e que assentam fundamentalmente num culto aos “filhos da terra”. Acredito que qualquer terra se sinta orgulhosa dos filhos que tenham sucesso dentro e fora dos seus limites geográficos. Não aceito é que se escamoteie, ignore ou simplesmente se descrimine a actividade, com mais ou menos sucesso, daqueles que não sendo portalegrenses, isto é, filhos da terra, mas que cá vivem, contribuem para o engrandecimento e desenvolvimento de Portalegre.

É uma prática muito provinciana, associada a uma ideia de comunidade hermética e selectiva: grupos de amigos, tertúlias de interesses, correligionários de partido e por aí fora. A riqueza das terras e dos lugares faz-se com a dedicação e admiração que se tem por esses lugares e territórios: nestes encontramos a natureza que nos envolve e as pessoas com as quais partilhamos os projectos, os afectos, o respeito e a admiração e, simultaneamente, a emergência de um espírito comunitário constitutivo de uma qualidade de vida colectiva.

Focaria apenas dois exemplos, distantes um do outro, e que são reveladores desta fragilidade cultural. O primeiro, há muito tempo, referia-se à saída de um portalegrense, isto é, de um “filho da terra” “rumo ao doutoramento”. Era assim a parangona em título de caixa alta num dos jornais locais. Afinal, depois de tantos portalegrenses, filhos de outras terras, terem também rumado ao doutoramento e terem voltado com o mesmo concluído. O que não aconteceu àquele outro, objecto de tão importante notícia.

O outro exemplo, mais recente. A atribuição do Prémio Pessoa ao Arquitecto Carrilho da Graça, portalegrense, digo, filha da terra. Nestes anos todos que vivo em Portalegre não tenho memória de ouvir falar muito, e publicamente, do arquitecto, a não ser há pouco tempo a propósito da reconstrução da Igreja de Santo António e agora com a notícia sobre o Prémio Pessoa. Quando porventura ouvia falar dele era como um arquitecto normal e, provavelmente, comunista. Mas valha-nos o Prémio para lhe perdoarmos o ser comunista, nem sei se o é de facto, e reabraçá-lo como um filho da terra, mas ilustre.

Tenho bastantes exemplos ao longo destes anos que vivo e trabalho em Portalegre e que me têm causado alguma perplexidade. De facto o que é preciso fazer-se, que ainda não se tenha feito e, porventura, ainda não se fez de facto, para que as mentalidades mudem e se tornem abertas ao mundo, isto é, para que se deixe definitivamente o patamar do retrógrado, do discriminatório e do chauvinismo.

Meus amigos, hoje, em Portalegre, temos portalegrenses, filhos da terra, como sempre houve tenho a certeza, que merecem este epíteto, porque foram e são cidadãos de referência nas suas áreas, porque são humildes na sua afirmação e porque são pessoas com uma visão cultural mais universal.

Temos também, e isto é importante para a aceitação de uma ideia de universalidade e de diferenças, portalegrenses, filhos de outras terras, algumas delas muito longínquas, que partilham exactamente este percurso de ser cidadão e pessoa em Portalegre, contribuindo desta forma, e sempre, para o engrandecimento da cidade, da região e do país.

07 dezembro 2008

O RENDER DOS HERÓIS

O conceito de Herói está, ainda hoje, bastante associado ao conceito clássico:

- o que se distingue no campo de batalha;
- o que pertence ao grupo dos mártires (da pátria, da religião, das causas...);
- o que arrisca a vida para salvar o Outro.

Juntou-se a este conceito, coexistindo ambos, aquele outro moderno, fruto da sociedade capitalista, que se traduz pela atribuição de títulos, de prémios e de benesses aqueles que se diferenciam nos mais diversificados campos do saber e do conhecimento, da Ciência e da Arte e, muito pontualmente, da Vida.

Vigorou, ainda vigorará, nas denominadas sociedades socialistas, aquele de inspiração soviética e maoísta: o Herói do Povo. Também este se distinguia nos campos do saber e do conhecimento, da arte e da revolução.

Em todos os conceitos o princípio que os sustenta é o da distinção e da singularidade e o facto de se pertencer a uma categoria minoritária.

Hoje, quando nos referimos ao herói teremos de falar no plural, quer dizer, nos heróis. A distinção, nos seus processos de heroicidade, não é considerada. É comum a todos e todas. A singularidade homogeneizou-se, isto é, todos e todas são singulares e comuns ao mesmo tempo. Finalmente pertencem, literalmente, à maioria.

Se é verdade que no conceito clássico e nos conceitos capitalista e socialista o herói se torna público e adorado, neste novo paradigma de heroicidade o acto é privado e indiferente, por isso, os heróis vivem lugares comuns: o quotidiano onde buscam o saber e o conhecimento, quando existem as mesmas oportunidades; onde lutam e conquistam, ou não, a dignidade humana; onde gerem o espaço e o tempo das diferenças e da multiculturalidade; onde os bons procuram ser melhores e os maus reconsideram a sua humanidade; enfim onde a estratificação social se faz através dos conflitos, que vão do individual ao colectivo e do local ao global. Estes heróis, isto é, a maioria da humanidade, precisa de ser admirada e amada pelos governantes. Precisa de olhar também para o interior de si própria, apostando num novo modelo de Mundo. O novo conceito de herói deveria tornar-se uma referência: a humanidade seria muito mais justa e mais equilibrada. Seria também capaz de admirar, sem conflitos, os mais capazes e os mais competentes, mas também as diferenças e a diversidade. O novo conceito de herói deveria estruturar-se filosoficamente pela sua dimensão plural e universal.

Esta minha reflexão não altera os princípios filosóficos do conceito de herói, pelo contrário amplia-o. É com este sentido que pretendo encontrar essa finalidade do acto heróico praticado de uma forma colectiva, anónima e quotidiana, como do acto heróico onde a singularidade é a própria originalidade.

Poderia nomear muitos heróis, aqui e agora. Mas, pelo que disse, a lista seria interminável. Convém não nos esquecermos deles, de nós, diariamente.

Mas também podemos lembrar-nos de outros que caminham ao nosso lado e, fazem eles próprios, percursos diferentes. Democratizemos então o conceito.

Gostaria de lembrar os 145 anos que fará amanhã, dia 08 de Dezembro de 2008, o Internato Distrital de Nossa Senhora da Conceição que, em Portalegre, tem vindo a demonstrar ser uma instituição, também ela heroína, cuja função de acolhimento de crianças e jovens em risco tem sido admirada e estimada por toda a comunidade. Fruto de muita solidariedade ao longo de todo este tempo de vida, mas também das responsabilidades institucionais e políticas e das equipas profissionais que nele sempre investiram.

Gostaria de lembrar as heroínas de ontem e de hoje: as crianças e jovens do sexo feminino que, ao longo deste quase século e meio de vida da Instituição, têm sido elas heroínas da sua própria existência, aprendendo a viver com dignidade, conquistando oportunidades e futuros sucessos de mais vida para além daquela institucionalizada.

Finalmente, a par de muitos idosos, anónimos, que trabalham até ao fim dos seus limites, quiçá da vida, nas suas áreas, nos seus campos, nos seus projectos de vida, gostaria de me lembrar deles através do centésimo aniversário que será feito a 11 de Dezembro por Manoel de Oliveira que, em plena vida e lucidez, continua a trabalhar naquilo que mais ama e sabe. O Cinema.

01 dezembro 2008

PEDRO PINHEIRO (1939-2008) - “O artista mais completo do espectáculo”*

1963! Não me recordo do mês. Talvez Setembro ou Outubro. Assistia, com minha mãe, à peça de Shakespeare “O Mercador de Veneza” no Teatro da Trindade em Lisboa. Lembro-me de alguns actores: Álvaro Benamor, Lígia Telles e Pedro Pinheiro, um jovem, estudante do Conservatório, dez anos mais velho do que eu.

Foi o meu primeiro contacto, apenas visual, com o Pedro Pinheiro.

1969. Dezembro, Teatro Maria Matos. Integrado na Companhia de Bailados de Anna Máscolo, minha mestra e directora, dançávamos, de Maurice Ravel, o bailado “Ma Mère l’Oie”. Partilhava o camarim com o Amilcar Martins e o José Salles, já desaparecido também. Fomos surpreendidos com a visita de Pedro Pinheiro e creio que, já nesta altura, o Alberto Barreto, o Beta para os amigos. Apenas para nos darem os parabéns pelo espectáculo.

Fevereiro de 1975. Évora, Teatro Garcia de Resende. A Companhia do Centro Cultural de Évora, actual CENDREV, tinha acabado de se instalar vinda de Lisboa, iniciando um processo de descentralização teatral. Representávamos nesse momento o Soldado Raso com uma encenação do meu professor do Conservatório e director também, Mário Barradas. Uma vez mais fui surpreendido por uma visita ao meu camarim pelo Pedro Pinheiro e, desta vez, tenho a certeza, também com o Beta.

De 1975 até poucos meses antes do seu falecimento tivemos oportunidade de construir, reciprocamente, uma amizade baseada na admiração e no respeito. Estivemos juntos em muitas tertúlias, em casa do Alberto Barreto, com jantares e conversas longas sobre arte, poesia, política, enfim sobre a vida.

O que me recordo do Pedro? Antes de mais por ser um intelectual, conhecedor do mundo e da vida. Um excelente dramaturgo, com obra publicada, e um óptimo actor e encenador. Talvez tivesse ficado mais conhecido pelo grande público pela sua participação no programa televisivo “Malucos do Riso”. Mas toda a gente sabe, aqueles que amam o Teatro, que o Pedro fez muito mais do que isso e durante bastantes anos.** Para além disso, o Pedro era uma Homem de uma enorme humildade e humanidade absoluta.

Lamento não ter estado junto dele nos últimos meses da sua vida. Estes coincidiram com momentos difíceis, também, na minha vida pessoal.

Chorei a sua partida, com pena de ter perdido um amigo.

http://noticias.sapo.pt/lusa/artigo/773126d86f959bcb0b6b0d.html *

- foto: Revista Actual do Expresso de 22 de Novembro de 2008