28 maio 2007

NOTAS SOLTAS


Gostaria de dar os parabéns ao José Vieira pela reorganização do seu blog http://www.anijovem.blogspot.com, esteticamente mais agradável e seguramente mais eficaz. A eficácia, de alguma forma, tem vindo a ser demonstrada pela qualidade dos artigos aí publicados. Penso que será o único blog a dar informações sobre a juventude, de uma forma organizada e sistematizada, com interesse para os animadores socioculturais. Meu amigo, parabéns por esse trabalho de excelente qualidade.

Gostaria de registar também o excelente trabalho desenvolvido pela APROTED - Associação de Professores de Teatro na Educação, para quem é importante a divulgação de actividades teatrais e, de alguma forma, o estatuto e a carreira profissional do professor desta área. Todavia, penso que seria interessante investir na formação em serviço destes professores, componente que pressionaria, estou convicto, a definição da carreira e dos estatutos. Ao mesmo tempo, e pela distância que nos separa do último Encontro Internacional de Expressão Dramática e Teatro na Educação, penso que seria oportuno, não só estrategicamente, mas também pela emergência face à inovação e à mudança sociocultural, organizar-se um Encontro Internacional com uma componente significativa de intervenção e reflexão portuguesa. O encontro com este blog faz-se em http://www.teatronaeducacao.blogspot.com

Entre 05 e 10 de Junho próximo vamos ter em Évora a 10ª edição da Bienal Internacional de Marionetas de Évora organizada, como sempre, pelo CENDREV e pelos Bonecos de Santo Aleixo. Gostaria de referir este evento não só pela qualidade dos projectos apresentados nas outras edições como, seguramente, pelo nível deste ano que corresponderá, estou certo, a uma maior qualidade. Isto só é possível pelo excelente trabalho desta Companhia no âmbito do Teatro de Marionetas. De tal ordem, que justifica ser uma das companhias mais solicitadas mundialmente. A questão interessante é ver como se conjugam a tradição e a inovação a partir de linguagens comuns: as marionetas.
Tenho, como muitos sabem, uma relação afectiva muito grande ao projecto do CENDREV que continua aquele outro em que me envolvi em 1975 com o Mário Barradas, o Luís Varela, o José Peixoto e tantos outros. Refiro-me, naturalmente, ao Centro Cultural de Évora.

Finalmente uma questão mais emocional. Quando os nossos jovens partem para outros destinos à procura de outros horizontes, de outras culturas e de outras oportunidades, ficamos todos sensibilizados pela sua coragem e pelo seu espírito de sacrifício. Ao mesmo tempo, já aqui o referi, mostramo-nos desejosos de que possam aprender muito e possam finalmente regressar e investir neste país de forma a contribuírem para o seu progresso e desenvolvimento. Assim, desta forma, é fácil entender. Mas quando se trata de um filho nosso, o coração aperta muito mais levando-nos a confrontar com um dilema: a vontade de que partam e vivam outras oportunidades e a vontade de que fiquem e esperem essas oportunidades…
O meu filho Pedro já nos habituou à sua ausência, caminhando pelo mundo em busca de olhares através da sua objectiva. Como jovem arquitecto não pára também e, depois de dois anos em Barcelona, logo ali ao lado, está agora em Nova Yorque, no outro lado do Atlântico. Procura saber mais como profissional e também como pessoa. Está a conseguir porque é corajoso e lutador. Mas dói! Vejam como ele sente Nova Yorque através do seu site:

21 maio 2007

ANIMAÇÃO CULTURAL - Conceitos e Propostas

Mais uma publicação do meu amigo e colega Victor Andrade de Melo, professor na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

O Victor Melo, é assim que o estimamos, reflecte e escreve amiúde sobre questões da estética da arte, particularmente da arte do cinema, relacionando-a com as práticas da Animação Sociocultural ou, talvez melhor, e conforme a sua reivindicação, com a Animação Cultural.

Esta obra, que convoca uma plêiade de autores de referência no âmbito dos Estudos Culturais, nomeadamente Thompson, Charney, Giroux, Debord, Cevasco, Buarque de Hollanda, entre outros, traduz uma ideia de associar a Animação Cultural à disciplina universitária atrás referida, tradicionalmente virada para a reflexão teórica das questões da cultura e, também, tradicionalmente mais estática.

Hoje, de uma disciplina universitária, de molde tradicional e com a perspectiva teórica de uma cultura mais estática e formal, para uma disciplina dinâmica, aberta, versátil e de questionamentos constantes, os Estudos Culturais ampliam o centro do seu objecto de estudo reapropriando-se de novos interesses e de novos estudos, mas também de novas práticas culturais, políticas, educativas e artísticas.

É neste contexto epistemológico que o Victor Melo entende poder relacionar uma nova abordagem dos Estudos Culturais com a prática da Animação Cultural, fortalecendo esta como uma prática mais dinâmica e reivindicativa na intervenção cultural e comunitária. Para este meu amigo, o objecto cultural está na base do crescimento individual e colectivo e na perspectiva de se atingir em pleno uma maturidade social. Este princípio é, para Victor Melo, e segundo a minha interpretação, a conquista do poder por cada um de nós.

A partir deste pressuposto aumenta a legitimidade para nos afirmarmos e reivindicarmos, isto é, aumenta a consciência individual e colectiva sobre a importância de práticas profundas de cidadania.

Afinal, atrás da Animação Cultural, Victor Melo reivindica para o Brasil aquilo que nós em Portugal, mas também em Espanha e em França, reivindicamos através da Animação Sociocultural: dinâmicas comunitárias fortes, maior desenvolvimento cultural, mais justiça social e, definitivamente, paz.

Afinal o Brasil continua a sua revolução promovendo o desenvolvimento. Nós é que parámos a nossa revolução.

Para Victor Melo “ A grande contribuição da Animação Cultural é implementar uma ideia de revolução relacionada à quebra da monotonia e à construção de uma ideia radical de liberdade e de escolha.” - pág. 25.

Um abraço para o Victor e para o Brasil.

13 maio 2007

4 Breves reflexões sobre práticas, de facto, de ASC

Reflexão 1 - Práticas de intervenção sociocultural

No âmbito da cadeira de Projecto Sociocultural do 4º ano do Curso de Animação Educativa e Sociocultural da Escola Superior de Educação de Portalegre (último ano de licenciatura), tenho vindo a realizar, dos últimos anos a esta parte, conjuntamente com os(as) estudantes finalistas, projectos socioculturais de intervenção comunitária.
A proposta de intervenção comunitária insere-se na dimensão de aquisições práticas a adquirir pelos(as) estudantes finalistas, futuros(as) profissionais de ASC, ao mesmo tempo que colocam os seus conhecimentos teóricos e práticos, adquiridos ao longo da sua formação superior, em correlação, mas também em cooperação, com as dinâmicas socioculturais locais já instituídas ou outras a instituir, se pensarmos ou decidirmos falar em criação da inovação.
A continuar esta breve reflexão, ou constatação, gostaria de recordar que estamos numa região, o Alentejo, com um défice demográfico bastante acentuado e que se tem repercutido, entre outras coisas, pela ausência progressiva de um movimento associativo local e regional.
Esta circunstância leva a que algum poder local, e não generalizo como é óbvio, tanto ao nível das câmaras municipais, mas também e talvez mais, ao nível das juntas de freguesia, se considere dono absoluto das emergentes, apesar de tudo, dinâmicas socioculturais.
Se é verdade que alguns dos bons autarcas, que entendem o que é a democracia, valorizam por isso mesmo o sentido da participação das comunidades e se assumem como parceiros dessas dinâmicas, outros há que preferem ignorar esta dimensão, resolvendo-se assumir como protagonistas e decisores daquilo que entendem ser o mais importante para as comunidades. Falamos aqui de um caciquismo local que não está ainda de todo irradiado daquilo que deveriam ser as boas práticas da democracia neste país.
Pois é. Afinal a lufada de ar fresco que estudantes finalistas de um curso superior de animação sociocultural ou de outro curso qualquer como o de serviço social ou até mesmo de professor(a) e/ou educador(a), poderiam levar aos lugares mais necessitados, mais isolados e, por isso mesmo, mais esquecidos, é absolutamente ignorada porque pode retirar esse protagonismo a quem pensa tê-lo por direito.
Mas, justamente, não tem o direito de fazer privar as comunidades daquilo que poderá ser, potencialmente, espaços de desenvolvimento local e comunitário.
Assim, terá de ser mais aberto ao mundo e…mais democrata.

Reflexão 2 - Reorganização e criação de hábitos de socialização e cooperação comunitária

Rentabilizar os recursos (espaços, meios e agentes) comunitários, colocando-os ao serviço da população, é consciencializar para uma nova interacção comunitária, ao mesmo tempo que se desperta nas pessoas a emergência para a participação individual e colectiva.
A emergência para a participação individual e colectiva nas comunidades foi desperta nas várias reuniões intermédias que a minha equipa, integrada num projecto de intervenção-acção mais amplo, promoveu junto de alguns parceiros locais, nomeadamente das autarquias locais, para além das escolas e associações, ou ainda de personalidades locais com influência democrática.
A resolução de alguns impasses, conducentes à participação dos cidadãos na vida comunitária, passou pela consciencialização da existência de problemas nos espaços que queríamos animar e na forma como se organizava a intervenção desses agentes locais. Essa consciencialização passou pela concentração dos agentes socioculturais locais pelos vários espaços comunitários em trabalho de Seminário.
Os Grupos ou Associações, envolvidos que estavam nas suas actividades, a maioria das vezes solitárias e muitas vezes numa atmosfera de competição exagerada, ignoravam, quase intencionalmente, a possibilidade de se trabalhar em conjunto para o bem colectivo. Este espaço de Seminário, que decorreu ora num Centro de Dia, ora num Centro Cultural ou ainda num Centro Comunitário ou sede de Associação, permitiu que os agentes socioculturais locais fizessem a auto-crítica sobre o seu papel e o trabalho comunitário desenvolvido até esse momento.
A constatação foi a de que, para além da sua actividade específica, a razão principal da sua existência, haveria mais para dar em termos comunitários se, porventura, coexistissem numa federação de intervenção local e comunitária. A partir desta organização, as estratégias de desenvolvimento sociocultural local comum tinham todas as condições de êxito. A dimensão inovadora desta intervenção foi a consciencialização para um papel de maior intervenção e para uma dimensão mais transversal da animação sociocultural local e comunitária.

Reflexão 3 - Animação sobre a Palavra

O pretexto para a realização deste produto surgiu para dar uma resposta coerente com os objectivos de um equipamento como um Centro de Dia, novo, por estrear, e que parecia condenado ao abandono por parte da população potencialmente fruidora desse espaço: os idosos. A informação na posse da equipa, era a de que os idosos desta comunidade não estariam interessados em ocupar este espaço, preferindo ficar em suas casas. A estratégia e a metodologia seguida, foi no sentido de envolver essa população na descoberta de um outro espaço e com vivências capazes de os fazer sentir úteis, contribuindo assim para a sua auto-estima.
Organizou-se assim, entre os idosos, protagonistas da história, mas envolvendo também a comunidade escolar e os animadores da equipa, uma sessão/convívio sobre a palavra, onde a poesia popular, centro de interesse de alguns desses idosos, foi a protagonista pelas vozes dos idosos e das crianças do jardim-de-infância e da escola do 1º ciclo locais, a partir de um trabalho conjunto e inter-geracional.
A dimensão inovadora desta intervenção-acção e que fez aumentar o interesse dos idosos pela frequência regular no equipamento, estava relacionada com o facto da equipa ter apresentado, no mesmo programa, momentos de poesia e prosa, a palavra dita, momentos de mimo, a palavra silenciosa e a palavra cantada com a apresentação de um grupo de cantatas, clássicas e modernas. Portanto, o contacto com novas linguagens da expressão e da comunicação.

Reflexão 4 - Formação (Não-Formal)

Este produto surgiu de uma necessidade intrínseca sentida por um grupo de teatro, recém-criado, composto maioritariamente por jovens sem qualquer experiência de representação ou de educação estética e artística, dirigido por um adulto assumidamente ensaiador, no sentido tradicional e associado à tradição dos “velhos” teatros de amadores. Este grupo de jovens tomou consciência, após a estreia do seu primeiro espectáculo no Centro Comunitário, da necessidade urgente de formação e de educação estética no campo teatral. Esta consciencialização foi sentida, apesar do esforço individual e colectivo envolvido, pela ausência daquilo que a função social e lúdica do teatro deve proporcionar: o prazer lúdico e a partilha. Mesmo sem hábitos culturais sistemáticos, os públicos de hoje são mais exigentes e, portanto, a crítica é mais contundente.
A dimensão inovadora desta intervenção foi estabelecida pela necessidade de se organizar a formação e educação teatral no que diz respeito, essencialmente, ao trabalho de actor e de encenação, assim como às opções estéticas do reportório. Mas também à importância educativa do teatro nas suas dinâmicas de desenvolvimento local.

08 maio 2007

QUERIA DIZER...

No passado mês de Fevereiro fez trinta e quatro anos que cheguei da Guiné conjuntamente com os meus camaradas do Batalhão de Caçadores 3832. Durante este período apenas me encontrei com eles duas vezes. A primeira, em Évora, acerca de 9/10 anos e a segunda, justamente no fim-de-semana passado, a 5/6 de Maio de 2007.

Estive sempre renitente em participar nestes convívios, porque é disso que se trata, onde supostamente se reencontram afinidades e emoções, outrora vividas em conjunto durante os vinte e quatro meses em que permanecemos no território africano.

O dizer que sempre me mantive renitente, foi o pretexto para afirmar a minha indisponibilidade de “embarcar” de novo em emoções, apesar de estarem registadas, e muito profundamente em cada um de nós. Foi afinal o pretexto para não querer reeditar esse estado de espírito, para meu descanso e consciência. Senti muito isso, ainda no meu primeiro encontro e já o Batalhão se reunia de há vinte anos a essa parte. Felizmente já não senti neste último encontro, talvez porque estejamos mais velhos e mais cansados. Mas também porque os nossos descendentes presentes têm uma visão mais racional e distante dessas emoções.

Fui fazendo a minha catarse paulatinamente. Envolvido pela criação artística, através da minha relação com a dança e com o teatro, e absorvido pela reflexão mais racional através da minha participação académica, nomeadamente em congressos sobre a guerra colonial.

Estes eventos, que reatam as ligações afectivas e a solidariedade, construídas num tempo e espaço, hoje de memórias, servem afinal para dizermos que os valores construídos em conjunto, no momento em que crescíamos à força para ser homens, permanecem inalteráveis, sinceros e sem saudosismos.