17 fevereiro 2008

TESTEMUNHO*

Hoje quero falar-vos de uma MULHER com letras maiúsculas! Discreta, sensível, generosa, empreendedora e solidária. Quero falar-vos hoje, neste programa, de Piedade Murta. Nada de natureza política me move a tomar esta iniciativa. Apenas a minha admiração e reconhecimento pelas causas que defende.

Desempenha, actualmente, e na sequência de mais de dois mandatos à frente da instituição, o cargo de Provedora da Santa Casa da Misericórdia de Portalegre. Nesta função, como noutras que foi desempenhando ao longo da sua vida pública em Portalegre, nomeadamente o de Vereadora da Câmara Municipal de Portalegre e o de Presidente da Junta de Freguesia da Sé, evidenciou uma capacidade para liderar projectos e iniciativas que, para além de serem dirigidas às populações, permitiram criar nestas espaços de cidadania e de noção de protagonismo colectivo conducentes à melhoria da sua própria qualidade de vida.

A nossa relação, sendo de admiração e de respeito mútuo, aproxima-nos também por algumas cumplicidades, isto é, pela vontade comum de uma intervenção cívica junto das comunidades e pela constatação e necessidade emergente de um desenvolvimento local capaz de fomentar espaços de cidadania conducentes ao crescimento e desenvolvimento do indivíduo e do grupo ou da pessoa e das comunidades.

As suas competências, transversalmente enriquecidas pelos cargos e funções que desempenhou, permitem-lhe com toda a serenidade e, ao mesmo tempo, determinação, definir estratégias de afirmação da instituição que agora lidera. Apesar da Santa Casa da Misericórdia de Portalegre fazer parte de um acervo cultural nacional, que é o movimento das Misericórdias Portuguesas, houve tempo em que a designação de asilo de velhos esteve bastante entranhada na cultura do quotidiano das pessoas e, associado a isto, a ideia de que os velhos estavam ali para morrer. Porventura no comportamento de alguns dos familiares dos utentes deste tipo de instituições, essa ideia, ou melhor, essa comodidade de pensamento ainda possa emergir. Todavia tenho quase a certeza de que, pelos valores humanistas que orientam Piedade Murta, ela e a sua equipa farão sistematicamente um trabalho pedagógico no sentido de, paulatinamente, irem alterando esta forma de pensar e de actuar.

Os anos à frente desta instituição, mais as suas competências técnicas e humanas, têm levado a eliminar este estigma e a transferir a Santa Casa da Misericórdia para um patamar, que não sendo de excelência, associado sobretudo a recursos materiais e humanos de luxo, é um patamar de assunção da dignidade e de respeito pelos utentes que beneficiam destes espaços de solidariedade. Com isto não quero dizer que outros provedores que antecederam Piedade Murta tivessem descurado esse bem-estar e essa qualidade de vida traduzidos em afectos e apoios existentes naquela instituição. Porventura a determinação de Piedade Murta tem sido mais mobilizadora de vontades e de sinergias em prol da melhoria das condições de vida das pessoas. Naturalmente que muito há por fazer, envolvendo vontades e meios. Os apoios oficiais e privados, os mecenas e a solidariedade da própria comunidade poderão transformar a Santa Casa da Misericórdia de Portalegre numa instituição de solidariedade social de referência na cidade e na região.

O conjunto de iniciativas levado a cabo no decurso do ano passado, e que continuam este ano, assim como o conjunto de outras actividades e valências a iniciarem este ano noutros espaços físicos da Instituição demonstram, claramente, uma intenção de mudança. O apelo sistemático solicitando a participação das populações nestas actividades só revela, da parte de Piedade Murta, um interesse crescente pelo envolvimento das populações nestas instituições, consciencializando-as para as dinâmicas da participação e da socialização, ao mesmo tempo que se desenvolve a reconstrução dos valores da solidariedade e a vontade de encontro de uma nova justiça social onde todos nós, para além do Estado, temos responsabilidades.

Piedade Murta é assim, para mim, o paradigma da entrega voluntariosa e o paradigma da mulher que se constrói pensando nos outros.
* Testemunho lido a 15 de Fevereiro de 2008 na antena da Rádio Portalegre inserido numa rubrica "Crónicas de Hoje" onde participo quinzenalmente às 6ªs feiras.