25 outubro 2009

O benefício da dúvida. Exactamente por ser artista.

Estou, literalmente, ligado afectivamente ao Teatro da Trindade por quatro razões:
1ª - porque o INATEL, tal como a sua antecessora, a FNAT, sempre souberam criar neste nobre espaço da cidade de Lisboa, um espaço de criação, de arte e de liberdade.
2ª - porque foi o primeiro espaço teatral que frequentei. Estávamos no início da década de sessenta (1963) e representava-se o Mercador de Veneza de W. Shakespeare. O meu primeiro espectáculo de Teatro ao vivo, como espectador naturalmente.
3ª - porque entre finais de sessenta e princípios de setenta do século passado foi palco de Óperas, de cujo corpo de baile fiz parte, integrado na Companhia de Bailados de Anna Máscolo.
4ª - porque entre finais do Séc. XX e princípios do Séc. XXI foi local de dinâmicas culturais e artísticas diversificadas, implementadas pelo meu amigo e colega Carlos Fragateiro. Acreditei no seu projecto para o Trindade. Decididamente fez um bom trabalho.
Vou acrescentar uma 5ª razão.
O Teatro da Trindade acaba de ser restaurado após um hiato de sessenta anos. O lustre, trazido de Paris em 1867, “desceu” à plateia do Trindade para ser limpo.*
É uma questão importante do ponto de vista do Património Cultural construído. Mas não é a única. A questão fundamental para mim assenta no facto de Cucha Cavalheiro, actriz e encenadora, ter sido nomeada por Victor Ramalho, Presidente do INATEL, para ser a próxima Directora do Teatro da Trindade. Conheço o trabalho de Cucha Cavalheiro como actriz e encenadora e, por isso mesmo, acredito no seu talento para gerir artisticamente o Trindade. Pela sua maturidade, experiência e honestidade intelectual, mas também pela sua sensibilidade na escolha da sua equipa, acredito no sucesso que o Teatro da Trindade viverá nas próximas épocas. Felicidades a Cucha Cavalheiro.
PS: Lembro-me, aquando da demissão de Gilberto Gil de Ministro da Cultura do Brasil, ter postado neste blogue uma apreciação sobre a importância de um artista ocupar esta pasta. Referia o facto de em Portugal isso não ter acontecido ainda. Eis que chegou a oportunidade. É mulher, pianista, gestora cultural e chama-se Gabriela Canavilhas.
Não me parece que a gestão da pasta da Cultura passe só por ter ou não o mítico 1% do orçamento. Passa também pelo exercício de uma sensibilidade e pelo cultivo de um gosto estético que respeite a diversidade cultural. Passa ainda pela coragem de implementar políticas culturais conectadas com outras da governação, de um país que precisa urgentemente de se desenvolver culturalmente.
Vou dar-lhe o benefício da dúvida, exactamente por ser artista.
* JORNAL DE LETRAS E IDEIAS - Nº 1019 - 21 DE OUT/09