12 abril 2008

DESOCULTAR COMPETÊNCIAS

Promover a autonomia, estimular a auto-estima, aumentar os níveis de literacia…” in: artigo “Somos encostados para o lado como uma peça velha”, Jornal Público, 06 de Abril de 2008.

Em Santa Maria da Feira desenvolve-se um projecto através da ALPE e da Câmara Municipal da Feira que tem como objectivo principal desocultar competências, no fundo, desocultar coisas que as pessoas já sabiam. O princípio é o de promover a autonomia, o de estimular a auto-estima e o de aumentar os níveis de literacia dos desempregados do Concelho. “É preciso contrariar estereótipos e preconceitos em relação aos desempregados, sobretudo aos de longa duração, de que se trata de preguiçosos.”

A forma de contrariar esse preconceito é concretizar, entre o tempo de espera por uma formação e o emprego, um espaço de consciencialização de se ser pessoa e de lutar pela sua dignidade. Como? Fazendo Teatro para descobrir-se.

Valorizamos bastante a função social da Animação Sociocultural e os critérios que legitimam essa função, sobretudo quando parte de um conjunto de estratégias implementadas pelo animador. Essa legitimidade advém das suas competências profissionais e humanas, mas também dos instrumentos que utiliza e que, pela sua natureza, fazem com que os protagonistas da mudança, os destinatários da animação, criem uma simbiose de expressão e de vida, projectando a sua existência num futuro mais justo e mais feliz e de mais oportunidades.

Considero, quer pelo exemplo que apresentamos, quer por uma experiência acumulada de artista-pedagogo-animador, que os instrumentos privilegiados para essa (re)descoberta de si surgem a partir do princípio fundamental transmitido pela Arte em geral e pelo Teatro em particular: a vivência e o exercício de uma verdadeira função social do Teatro. Nela, as questões da educação, da fruição e criação estética e artística, da consciência social e das práticas culturais têm uma dimensão associada ao tempo e ao espaço individual da procura, da descoberta e da realização pessoal. Mas têm também, pela sua pluralidade, a emergência de processos de socialização que valorizam a dimensão axiológica nas relações humanas.

Aqui, em Santa Maria da Feira, os desempregados, actores sociais em desespero são, através do Teatro, actores em descoberta de competências diversificadas. São, através da fábula, personagens que vivem a coragem, que praticam a decisão e que lutam pela esperança.

Em Santa Maria da Feira, os desempregados, sobretudo os mais velhos, são actores e personagens que o Teatro convoca para, em conjunto com toda a comunidade, transformar as mentalidades e apelar aos valores, especialmente à partilha e à solidariedade.