05 novembro 2007

PORQUÊ TANTA ARROGÂNCIA INTELECTUAL?

Temos vindo a ser confrontados com laivos de arrogância intelectual e tiques de autoritarismo político por parte do governo que decide hoje os destinos de Portugal. Não nego que muitas das decisões tomadas em nome da governação do país são importantes e inadiáveis; reconheço que a tarefa não é fácil e que é mesmo difícil agradar a gregos e a troianos.

A História recente mostra-nos que o comportamento dos governos maioritários tem sido pautado por alguma arrogância perante aqueles que não estão, nem têm condições institucionais e políticas de mostrarem o seu descontentamento, a não ser através dos sindicatos e dos partidos, nos quais, eu e muita gente, nos revemos hoje cada vez menos.

A arrogância de que vos falo surgiu intensamente durante o período em que Cavaco Silva era primeiro-ministro e surge agora mais refinada com o governo de Sócrates, que não me atrevo a chamar de governo socialista. Tivemos na altura da maioria do PSD, e temos agora com a maioria do PS, muitos factos enunciadores desses tiques de autoritarismo pouco próprios de uma democracia plena, tanto na prática governativa como na gestão do quotidiano das populações através dos pequenos poderes não assumidos dos comissários políticos. Mas, também, através de um certo caciquismo político de circunstância que temos dificuldade em irradiar da sociedade portuguesa e que nos vai afastando da autonomia política, cultural e social, deixando-nos para trás, na Europa a que queremos pertencer.

Talvez valha a pena de nos questionarmos sobre a Europa que queremos pertencer. Temos agora a oportunidade de o fazer através de um Referendo, ainda não assumido pelo governo, sobre o Tratado que vai ser assinado em Dezembro próximo. Decididamente, eu quero pertencer à Europa e tenho a percepção de que a maioria do povo português também o quer. Apenas nos questionamos sobre as decisões tomadas só pelos governos e que não emergem de consultas e de esclarecimentos com as populações.

Senti essa arrogância intelectual na Conferência Nacional de Educação Artística que decorreu no Porto, na Casa da Música, entre 29 e 31 de Outubro. Falo da organização de um evento, da responsabilidade do Governo e da UNESCO, que deveria ter maior participação democrática dos participantes. Para além de, aos relatores das sessões plenárias não terem sido fornecidos previamente os resumos ou as próprias comunicações, para um melhor exercício de relator, também fomos confrontados com a ausência de debate ou do contraditório sobre muitas das afirmações aí produzidas. Também não foi nas mesas redondas que essa democracia se implementou devido ao excesso de comunicantes e à ausência de controlo do tempo que atravessava diariamente o evento. Sobre o apoio do staff quero referenciar alguns momentos de menos educação de alguns dos seus elementos quando, naturalmente por ordem de alguém, assumiam uma arrogância e poder na gestão da ocupação física do espaço onde decorreu o evento. Aliás, incomodou-me bastante ver aqueles jovens vestidos de negro com aparelhos de comunicação nas mãos a controlarem todo o nosso movimento quando, porventura, nos dirigíamos a um espaço de mesa redonda e nos apercebíamos não ser aquele o que nos interessava, levando-nos, nesse instante, a procurar outro. Que imagens me surgiram nessa altura na mente.

A nossa consciência crítica foi finalmente traduzida, sem mandato, pelo conferencista que encerrou a Conferência Nacional. Precisamente o anfitrião da Casa da Música, o Maestro José Luís Borges Coelho. Durante quase uma hora o maestro criticou a ineficácia das decisões que emanam destes eventos oficiais ou oficiosos. Do meu ponto de vista são espaços que se transformam em autênticas feiras de vaidade. O Maestro referia-se às conclusões do encontro, acabadas de serem apresentadas pelo comissário da Conferência, como conclusões das conclusões, das conclusões de outros eventos semelhantes, realizados nos últimos anos, e sem que nada tivesse mudado. A este propósito apelou a maior acção e menos conversas.

Vamos ver se as palavras do Maestro têm ressonância nas decisões a serem tomadas sobre a Educação Artística em Portugal ou se não ficam uma vez mais como conclusões…inconclusivas.