24 julho 2007

A VIDA É FEITA DE PEQUENOS NADAS

Existe em Portalegre um conjunto de pessoas, não muito extenso, por quem eu tenho uma enorme admiração e respeito. Todas elas me colocam, suponho eu, no mesmo nível de consideração. Todavia não têm todas a mesma atitude perante a comunidade e perante as dinâmicas aí instituídas, enfim, os seus processos de socialização são diferentes, levando a que uma parte da comunidade tenha delas opiniões bastantes díspares, às vezes polémicas até.

Vem isto a propósito de um ilustre portalegrense que tenho o prazer de conhecer, há já muitos anos, e pelo qual tenho uma enorme admiração. Estivemos, no início do nosso relacionamento, muito mais próximos. Não tanto por um convívio sistemático, que não houve de facto, mas mais pelas conversas interessantes que tivemos em oportunidades criadas esporadicamente. Durante o período que estive em Montréal, no Canadá, trocámos uma ou duas cartas, nas quais tive o privilégio de receber textos muito interessantes de sua autoria. Já depois, em Portalegre, fez-me o favor de participar numa conferência organizada para os meus alunos de Sociologia da Arte. Posteriormente, quando eu coordenava a licenciatura de Animação, tornou a manifestar a sua simpatia ao poder partilhar com os jovens desse curso, mas também com alguns professores, o seu saber e a sua experiência de poeta, ensaísta, dramaturgo e pintor. Falo, como é evidente de Nicolau Saião.

As nossas relações de proximidade dão-se quando, por acaso, nos encontramos na rua. Vou sabendo deste meu amigo por aquilo que vou lendo, dele ou sobre ele. Nomeadamente através de uma revista on-line brasileira bastante interessante, a Agulha.

Foi precisamente o último número desta revista, www.revista.agulha.nom.br, que me inspirou este texto. Nicolau Saião escreveu sobre Agostinho da Silva e duma forma tão sublime que, seguramente, fez aumentar os admiradores por esse Homem singular de inteligência e de humildade.

Dos encontros raros e apressados que temos na rua, observo um Nicolau Saião desiludido e triste com a sua comunidade. Talvez por isso ele se recolha demasiado, digo eu. Todavia, em qualquer comunidade, temos pessoas que não gostam de nós e, felizmente, outras que manifestam contentamento e felicidade pelos nossos sucessos.

Tenho pena, acreditem, que Nicolau Saião esteja pouco entre o seu povo, que ele adora, tenho a certeza. Tenho imensa pena que o seu saber e a sua arte não façam parte do quotidiano desta comunidade. Tenho afinal muita pena que toda a produção literária e artística de Nicolau Saião, que percorre a universalidade, não seja um património acessível a toda a comunidade. Aqui, o poder, especialmente o local, tem uma quota-parte de responsabilidade nesta tarefa: acarinhar e divulgar os artistas da sua região.

Mas a minha última observação vai dirigida ao próprio Nicolau Saião, se deste texto ele tomar conhecimento. Meu amigo, eu sei que por temperamento é um homem reservado e discreto. Todavia isso não impede que se reaproxime de nós todos, frequentando o que esta bela cidade tem para oferecer. Este gesto tão simples como o de conviver torna mais suave qualquer desilusão e torna maior a compreensão que contribui para o aumento das empatias. Sobretudo, temos todos responsabilidades de criar oportunidades que nos conduzam à socialização e ao espaço onde cada um de nós tem para dar e para receber. A vida é isto mesmo, não é verdade?